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quinta-feira, 30 de maio de 2013

GRAÇA OU CASTIGO?



Tenho percebido que muitas igrejas estimulam em seus adeptos a crença em um Deus tirano que sempre se afasta deles como forma de castigo; para mostrar insatisfação pelo comportamento dos Seus seguidores. Nessa perspectiva há uma ênfase na maldade humana, na falta de boa vontade deste e no desejo divino de punição. Deus quer mostrar ao homem o Seu poder de controle e o rigor da Sua vigilância. Ele quer destacar a incapacidade humana de agir corretamente ou desejar ser bom. A relação entre o homem e Deus, nessa perspectiva, se estabelece em termos de culpa e castigo, falha e punição.
Penso que uma religião com essas características não é saudável. Não contribui para o crescimento humano porque estimula a timidez, a autodelação e a flagelação moral. A ênfase na impossibilidade ou na inconveniência de um agir com autonomia é  desestimulante do progresso pessoal.
O medo de Deus não produz desejo espontâneo de contribuir com Ele; pode produzir a contribuição servil, mas não a espontaneidade. Não estimula a superação do “espírito” de escravo e não estimula a produção de uma nobreza de  “alma”.
Um ser humano com medo, sem ousadia, carregado de  sentimento culpa, é facilmente controlado por líderes incompetentes ou inescrupulosos.
Penso na nossa relação com Deus de forma diferente. Penso em termos de graça e oportunidade.
Ilustro o meu pensamento com o exemplo de uma mãe e seu bebê. A criança não anda, mas não o faz por culpa dela ou por ter cometido alguma infração de ordem física ou moral. Não anda por uma questão circunstancial, por uma condição própria do ser humano. Não há maldade em seu gesto de  ficar deitada, há apenas uma limitação própria da sua idade.
A mãe, por sua vez, ao colocar a criança no chão, e ao se afastar um pouco,  para que ela role e se arraste pela casa, não está sendo maldosa ou punindo-a por não andar. Está apenas fazendo-lhe um favor, dispensando graça, para que ela cresça saudável e desenvolva os seu potencial. A mãe, ao assim proceder, quer  conduzir a  criança a uma vida de autonomia, portanto, a uma vida saudável em todos os aspectos.
Em minha vida tenho sentido que Deus muitas vezes se afasta. Parece que Ele se esconde por longo tempo, mas não entendo que isso significa que eu tenha errado ou que Ele esteja desgostoso comigo. Sei que, como ser humano, tenho minhas limitações e a necessidade de superá-las. Entendo que para o meu próprio bem, para estimular o meu crescimento pessoal, para me tirar do comodismo  de nada fazer e tudo esperar, para me levar a produzir o que ainda não produzi por acomodação, para ampliar a minha possibilidade de ser feliz ao contemplar as minhas realizações pessoais, Deus precisa se esconder de mim por algum tempo. Tenho percebido que Ele  se esconde, mas não vejo isso como punição; vejo uma manifestação de graça, de bondade e de respeito.
Não me sinto culpado pela Sua ausência, sinto um privilegiado por merecer tamanha confiança no meu potencial.
Deus, no meu entender, não está buscando culpados. Ele está “caçando” talentos. Está apostando em quem consegue a autossuperação, em quem age mais do que ora, em quem consegue se suprir para poder olhar para trás e dizer: “venci”. Deus não quer fracassados ou eternos dependentes. Ele quer ousados e felizes.
 O meu Deus é um Deus centrado na graça e na oportunidade e não um Deus centrado na culpa e no castigo. E o seu?     
 Antonio Sales         profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 30 de maio de 2013. (Feriado de Corpus Christi)

sábado, 11 de maio de 2013

SER MÃE ONTEM E HOJE



Nós, do gênero masculino, temos dificuldades para entender os sentimentos de uma mãe. Nunca saberemos o que significa ser mãe, mas podemos imaginar como temos contribuído para que a sua vida seja melhor ou pior, para que a maternidade tenha mais sentido ou menos sentido.
Neste texto tento conjecturar como tem sido a experiência de ser mãe em diversos momentos da história. Tomo por base a história sagrada do cristianismo supondo que muitos, mesmo não cristãos,  tenham alguma informação sobre ela.
Buscando na antiguidade encontro nomes como Sara (esposa de Abraão), Rebeca (esposa de Isaque filho de Abraão), Raquel (esposa de Jacó neto de Abraão) e Ana (conhecida por ser a mãe do profeta Samuel). O que há em comum entre essas mulheres é que foram estéreis a maior parte da vida conjugal. Todas elas em algum momento da vida se angustiaram com essa situação. Todas deixaram escapar de alguma forma algum lamento. Lamentos explícitos ou em forma de exigência para que o marido as fecundasse ou fecundasse alguma escrava para que elas adotassem o filho.
 É possível imaginar as dores que sentiam uma época em que ser mãe era a principal (ou talvez a única) função da mulher.
A fêmea que não procriava era inútil. Essa era a lição que a natureza lhes transmitia. Ao verem a procriação sendo valorizada sentiam mais intensamente a “síndrome do útero vazio”.  O sentido da existência lhes escapava e a angústia que sentiam pela esterilidade é difícil de avaliar. Alguns maridos sofreram com elas (Abraão) outros se impacientaram (Isaque e Jacó) e  alguns, como Elcana,  não as entenderam. A “síndrome do útero vazio” trazia-lhes desespero e desejo de morte. A humanidade lhes foi ingrata ao compara-las com as demais fêmeas. Extrair lições práticas da natureza nem sempre faz bem à vida,  nem sempre é sábio.
Para completar a sua angústia, a ausência de filhos era tomada como sinônimo de maldição divina ou capricho dos deuses. Não tenho dúvidas de que o mundo já foi pior para as mães.
Viajando um pouco mais no tempo procuro imaginar o que era ser mãe nos dias Jesus.
Aliás, os homens nunca valorizam o produto do ventre feminino. Cobrava-lhes produção, mas não valorizavam os filhos. Tratava-os com grosseria. Impacientavam-se com eles e, muitas vezes, culpavam a mães pela inquietação dos filhos e pela não “moldagem” deles ao era esperado pelo pai.
 No tempo de Jesus algumas mães tiveram o privilégio de encontrar alguém que valorizou o fruto do seu útero. Consta nos evangelhos que Jesus certo dia, ao ser rodeado por mães,  tomou as crianças sem seus braços e as abençoou.
Talvez isso tenha acontecido uma única vez, mas o cronista registrou como um dos feitos importantes de Jesus. Talvez ele tenha pensado em enaltecer o seu Mestre, mas eu penso que com esse registro  ele enalteceu as mães. Enalteceu as mães porque trouxe ao mundo uma nova visão sobre maternidade, a visão de que o fruto do ventre de uma mulher é um ser humano e deve ser valorizado, respeitado. Cada sorriso que damos a uma criança valorizamos a mãe que a gerou. Cada afago, cada elogio, cada oportunidade que damos a uma criança é uma apologia à maternidade. Afagar uma criança é como acariciar a mãe que a gerou.
Valorizar um filho, promover legitimamente um filho é o melhor elogio que se pode oferecer a uma mãe.
Até recentemente, pela alta mortalidade infantil, era como se toda mulher tivesse um punhal cravado no útero. A “maldição” da morte lhes acompanhava e o pesadelo do útero esvaziado se fazia sempre presente.
Em nossos dias as perspectivas  são outras. Mulheres não precisam ser mães para serem respeitadas, e as que são mães recebem (pelo menos um pouco) do tratamento que merecem. As políticas públicas em favor das mães ainda precisam melhorar, mas a sua presença mostra que a mãe começou a viver em outro tempo.
Apesar dos avanços científicos e sociais que trouxeram uma nova luz, para toda mulher que deseja ser mãe, há uma lamentável sombra no seu caminho: as drogas. As drogas ceifam-lhes o prazer da maternidade quando a mãe já deveria começar a colher os bons frutos da sua fertilidade. Eis a sombra que nosso século trouxe às mães.
Creio ser desnecessário deixar aqui um apelo para que nos unamos no combate a esse flagelo social que faz sangrar o coração de muita mulher que sonhou em ter um útero benfazejo.
Mãe, só você pode entender o mistério que circunda a sua vida.
Parabéns pelo seu dia.
Antonio Sales       profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 11 de maio de 2013.

domingo, 5 de maio de 2013

AINDA MATAMOS OS PROFETAS?



Jesus certo dia pressionado pelos escribas e fariseus disse-lhes que eles eram culpados pela morte dos profetas que tanto veneravam. Eram filhos daqueles que mataram os profetas (Mt 23:29-31).
Na história do povo israelita os profetas não eram bem vindos embora as gerações futuras redessem homenagem a esses corajosos que se levantaram para defender a justiça. Jesus disse que alguns foram mortos no altar, inclusive. Altar era o lugar de proteção da vida. Quando alguém se sentisse ameaçado fugia para o templo e se colocava ao lado do altar, agarrado a ele, e era protegido pelos sacerdotes. A lei levítica previa isso.
Alguns profetas foram mortos no altar. Por quê? Quem eram os profetas?
Profetas eram vozes discordantes, vozes que soavam alertando do engano em que as pessoas se encontravam, vozes que denunciavam a hipocrisia em que liderança vivia,  eram pessoas que condenavam a duplicidade no viver, que denunciavam as injustiças sociais e a exploração da ignorância do povo. Os profetas que falavam em nome de Deus condenavam os líderes da nação porque mantinham o povo sob pressão psicológica, opressão econômica e opressão política.
Profetas eram vozes que condenavam o isolamento em relação aos problemas sociais, que se posicionavam contra aqueles que viviam como se os problemas sociais não lhes diziam respeito.
Denunciavam aqueles que viam o “mundo lá fora” como sinônimo de corrupção e os de dentro como seres purificados, imunes a esses malefícios. Eram contra os que separam as pessoas em duas categorias estáticas: os mundanos e os da igreja.
Essa classificação colocava os judeus (e nos coloca hoje) na posição de julgadores do mundo, classificadores de pessoas e nos impede de ver os próprios erros, de tirar a trave do próprio olho.
Eram  (e ainda são)  denunciados pelos profetas os maldizentes, os produtores de intriga, os adúlteros (qualquer espécie de adultério), todos que se julgam superiores pelo fato de estarem dentro do “redil” mesmo que devorando ovelhas e que tenham a pele da cor da pele do lobo. São denunciados o que têm a pele manchada pelo “sangue” de ingênuos que se deixam seduzir pelos seus discursos e se tornam vítimas de suas ideias estapafúrdias.
Os judeus mataram aqueles que denunciavam os que confiavam no templo, numa prática mecânica da religião, e ignoravam as necessidades humanas (Jr 7:4-6).  Rejeitaram aqueles que lhes dizia que a sua religião os estava conduzindo ao abismo, ao obscurantismo, à intolerância. Rejeitaram aqueles que procuravam lhes mostrar que estavam sendo enganados pelos seus líderes, seduzidos por discursos fabricados com intenções de amedrontá-los. Mataram os que lhes diziam que estavam sem crescimento moral e espiritual porque eram mal conduzidos.
Hoje não somos diferentes. Ainda matamos profetas. Se não lhes derramamos o sangue, porque as leis não permitem, provocamos lágrimas copiosas. Causamos-lhes desespero ao verem a nossa estupidez e nossa falta de vontade de abrir os olhos. Matar nem sempre significa tirar a vida; pode significar também amordaçar, desprezar, fazer pouco das suas palavras.
Todos aqueles que procuram abrir os nossos olhos, apontar para o verde que está fora do redil do falso pastor, são excomungados por nós. Preferimos quem nos engane, que nos faça crer que estamos no caminho certo. Preferimos quem nos humilhe aos que nos alertam.
Campo Grande, 01 de maio de 2013.
Antonio Sales     profesales@hotmail.com