Como cristão aceito o
credo evangélico de que o Bem é eterno e o Mal é contingente. Concordo que devemos aceitar o Bem e rejeitar
o Mal. O problema que não está claro para mim é até que ponto o mal é filho do
Mal. Uma pessoa que faz um trabalho mal-feito não é, necessariamente, uma má
pessoa, um mau caráter. O mal-feito pode ser apenas a imperícia de um aprendiz.
Até que ponto um acidente fatal é produto do Mal? Não pode ser apenas um
acidente, uma imperícia?
Penso que o mal que é
produto do Mal é aquele que é resultante de um mau caráter.
Como creio no Evangelho
de Jesus Cristo, isto é, na Boa Nova trazida por Ele, tento entender o problema
à luz da graça e não das definições teológicas. A graça de Cristo, na minha
perspectiva, tem poder “sedutor”. Ela nos “seduz” para a prática do bem embora
não nos defenda dos dilemas éticos próprios de uma vida relacional que é
conduzida pela reflexão sobre o que se faz.
Alguns definem o seu comportamento
(digo melhor, julgam o comportamento dos outros) pelos dogmas. Esses não têm
dilemas e, talvez, nem sentimento de compaixão. Outros definem o seu
comportamento pelo comportamento do grupo ou da multidão. Também estes não têm
dilemas e, talvez, nem autonomia para pensar.
Os que pensam sobre o
que fazem se defrontam diariamente com dilemas onde o certo e o errado se
misturam. Quando é certo proteger um animal e, ao mesmo tempo, é certo
sacrificá-lo para alimentar um ser humano e evitar que este morra de inanição,
o dilema se faz presente. Quando é certo oferecer o melhor em um culto de
adoração a Deus e, ao mesmo tempo, é certo envolver pessoas inexperientes (que
quase sempre erram) nessa adoração o dilema se evidencia.
Falo desse mal que não
é gerado pelo Mal e penso que neste aspecto a tolerância tem lugar, o mal e o
bem devem conviver lado a lado e se complementarem. Creio que nesta perspectiva
o mal é o prelúdio do bem e ambos são filhos do Bem porque gerados pela mesma
mensagem evangélica que prega o respeito, o bom senso e a compaixão.
A ideia de que todo mal
é mau, de que toda pessoa que erra tem mau caráter é a causa de intolerância para
com as pessoas. Esse é o problema de muitos relacionamentos, a causa de muitos
discursos amedrontadores e de muitas bombas lançadas sobre inocentes.
Creio no cumprimento da
promessa feita a Adão e Eva que Deus poria inimizade entre o seu descendente e
as insinuações da serpente (Gn 3:15). Creio que a graça tem produzido vidas novas que não
temos conseguido cultivar por termos ideias equivocadas sobre o plano de Deus.
Ela tem produzido novos sentimentos que não temos conseguido alimentar por estarmos
apegados a ideias preconcebidas.
O dogmatismo cega, o
fundamentalismo degenera e agride, a graça renova e produz tolerância.
Por fim, creio que o mal (o que
não é produzido pelo Mal) deve ser superado, mas não visto como um inimigo ao qual
se declara uma guerra implacável. Deve ser superado porque é parte de um
processo; é como o andar trôpego de uma criança que precisa ser aperfeiçoado ou
como o ensaio de um aprendiz que caminha para profissionalização.
Logo, esse mal é um bem em estagio
inicial de formação.
Por sua vez, o mal que é produzido pelo Mal, deve ser combatido porque o mau caráter deve mesmo ser detestado e corrigido com todas as nossas forças.
Por sua vez, o mal que é produzido pelo Mal, deve ser combatido porque o mau caráter deve mesmo ser detestado e corrigido com todas as nossas forças.
Antonio Sales
profesales@hotmail.com
Campo
Grande, 14 de outubro de 2012.
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