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domingo, 23 de setembro de 2012

OBEDIÊNCIA: PROVA DE AMOR A QUEM?



É interessante prestar atenção nos diversos pontos de vista sobre determinado assunto. Por ser formado em Matemática e viver do exercício da profissão de professor dessa disciplina sempre tive dificuldade em conviver com opiniões divergentes. Entendia que o certo e o errado estavam bem definidos e, portanto, sem margem para questionamentos. Mudei minha visão. Ainda tenho choques, mas confesso que está mais fácil administrar as contradições. Minha mudança de visão pode ser percebida no meu livro publicado em 2011 sob o título: “O HOMEM, A LEI E A GRAÇA EM ROMANOS”.
Hoje gosto de visitar igrejas e comprar pregações sobre determinado tema somente para analisar a variações de significado atribuído aos conceitos bíblicos ou teológicos.
Há poucos dias assisti a um estudo sobre obediência. Estava habituado a ouvir que a obediência (aos dez mandamentos)  é uma prova de amor a Deus e ao próximo. Durante muito tempo também defendi essa ideia. Depois passei a pensar diferente. Passei a pensar no amor sob outro ângulo e na obediência também sob outro viés.  Passei  a ver o amor relacionado com o espeito e a obediência também como possível de ter interface com o respeito. Logo, em determinadas circunstâncias, o amor e a obediência se entrelaçariam tendo como intersecção ao respeito. Sei que é possível ter obediência sem respeito, mas não penso na possibilidade de haver amor sem respeito. Por isso, em determinadas circunstâncias, os dois (amor e obediência) se entrelaçam pelo respeito.
Na última aula que tive sobre o assunto o enfoque era outro. Embora o ministrante do estudo enfatizasse o valor da obediência sua perspectiva não tinha nada a ver com o que eu tinha aprendido. Era um enfoque antropocêntrico e não teocêntrico como eu estava habituado a ouvir. E, apesar de ser antropocêntrico,  o foco não era o outro, era eu.
A lei fora dada por Deus não para provar o meu amor por Ele ou para me estimular a amar o próximo. Ela fora dada para o meu benefício, para a minha proteção. Ela não seria uma razão para eu amar, mas um meio de eu me cuidar, de me proteger.
Achei interessante essa ideia e perfeitamente defensável. Se eu já havia renegado a visão que haviam me passado da função da obediência agora tenho razão para tranquilizar a consciência quanto a isso.
A ideia é a seguinte: se tenho uma criança pequena em casa devo proteger os orifícios da  tomada  de energia. Posso fazê-lo por três motivos:
1.                      Proteger a tomada. Evitar que a criança danifique–a introduzindo objetos estranhos que a inutilizem.
2.                      Proteger-me. Se a criança levar um choque poderei ser condenado pela sociedade como pai relapso. Protegendo a tomada estarei livre desse incômodo.
3.                      Proteger a criança. Sempre vou criar oportunidade de dizer para ela que é perigoso para crianças. Pode causar danos a ela. Quando ela for do tamanho do papai poderá usar a tomada sem problemas.
As duas primeiras razões são as que me apresentaram primeiro para a obediência à lei.
Deus não queria ter dor de cabeça comigo  e por isso prescreveu o que não devo fazer ao meu próximo para não ter que se intrometer em encrencas.  Também não queria ver o seu nome sendo desrespeitado, ou ser tratado como um deus qualquer e, até certo ponto, irresponsável.
 A última razão me foi apresentada nessa última aula que tive. Devo obedecer para evitar contratempos para mim.
Na hora lembrei-me de um “caso” escrito por Nelson Rodrigues que ilustra muito bem  a vida como ela é. Trata-se do “caso” de um homem casado que arrumou uma amante. Como a amante, pensando que ele fosse solteiro, exigia que ele dormisse com ela toda noite ele teve que abrir o jogo. Ela aceitou a condição desde ele jantasse todo dia com ela. Sem opção ele aceitou. Acontece que a sua esposa, que não sabia de nada, queria agradá-lo e toda tarde preparava um jantar especial para ele e esperava-o para o jantar.
Dessa forma o homem passou a jantar duas vezes. A amante, para que ele não jantasse com a esposa, caprichava no jantar e empanturrava-o de comida. Ao chegar a casa, pouco tempo depois, encontrava a esposa com outro jantar à sua espera. Por ironia, ela sempre perguntava se o jantar estava bom e ele, por desencargo de consciência, dizia que sim. Ela então reforçava o seu prato.
Pouco tempo depois ele foi encontrado morto no quarto da amante ao lado de um bilhete que dizia: “não suporto mais jantar duas vezes”.
O “caso” narrado por Nelson Rodrigues ilustra perfeitamente essa visão de obediência para me proteger. Durante toda a minha vida tive pressentimento de que esse era o sentido da obediência embora não soubesse formalizar o pensamento e o discurso estivesse impregnado do que havia aprendido. Sempre procurei levar uma vida  de respeito às normas porque sabia que o desrespeito a elas prejudicaria a mim mesmo. Foi por isso que a última lição sobre obediência foi tão importante para mim. A ênfase do ministrante foi, na minha perspectiva, perfeitamente plausível.
 Entendi que a obediência às normas da moral e à lei divina é uma prova de amor a mim mesmo.
Apenas para encerrar acrescento que, na minha perspectiva, a  lei de Deus não se resume  nos dez mandamentos;  é toda orientação moral encontrada nas escrituras.
Antonio Sales  profesales@hotmail.com
Nova Andradina, MS, 23 de setembro de 2012.

Um comentário:

  1. Recebi da minha filha um e-mail fazendo uma observação sobre este texto. Após destacar a seguinte parte:
    “A ideia é a seguinte: se tenho uma criança pequena em casa devo proteger os orifícios da tomada de energia. Posso fazê-lo por três motivos:
    1. Proteger a tomada. Evitar que a criança danifique–a introduzindo objetos estranhos que a inutilizem.
    2. Proteger-me. Se a criança levar um choque poderei ser condenado pela sociedade como pai relapso. Protegendo a tomada estarei livre desse incômodo.
    3. Proteger a criança. Sempre vou criar oportunidade de dizer para ela que é perigoso para crianças. Pode causar danos a ela. Quando ela for do tamanho do papai poderá usar a tomada sem problemas.
    As duas primeiras razões são as que me apresentaram primeiro para a obediência à lei.
    Deus não queria ter dor de cabeça comigo e por isso prescreveu o que não devo fazer ao meu próximo para não ter que se intrometer em encrencas. Também não queria ver o seu nome sendo desrespeitado, ou ser tratado como um deus qualquer e, até certo ponto, irresponsável.”
    Ela pergunta:
    “Pai, o sr. por acaso não queria escrever que seria a primeira e terceira razão as que sempre foram ensinadas?
    A resposta é não. Eu queria dizer exatamente o que eu disse, mas devo admitir que o texto admite dupla interpretação. Há uma ambiguidade evidente que precisa ser esclarecida.
    Analisemos os dois ângulos sob os quais o texto pode ser lido.
    1. As razões que Deus teria para nos proporcionar a lei.
    2. As razões que o ser humano pode ter para obedece a lei.
    Se levarmos em conta as razões porque Deus deu a lei penso que me expressei corretamente. Deus deu a lei para o meu bem. Ele queria que eu não tivesse “dor de cabeça” por mera ignorância. No entanto, não foi isso que me disseram. Fui ensinado que não deveria desobedecer para não desonra- Lo.
    Se levarmos em conta os motivos que me apresentaram para eu guardar a lei, a minha filha está com a razão. As razões que eu teria para obedecer seriam:
    a) Proteger a Deus e a igreja de um possível escândalo. Evitar que tivessem o nome desonrado por uma conduta inadequada da minha parte;
    b) Montar o meu amor para com o próximo. Faltou esclarecer-me que o amor ao próximo é fruto do respeito e não da guarda à lei. Nesse caso a guarda à lei é uma forma de me proteger de possíveis problemas.

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