Por vezes ouço alguém
dizendo: “é preciso conhecer a verdade”.
Ou ainda: “não querem saber (ou ouvir) da verdade”. Paro e me pergunto: o que é a verdade? Do que essa pessoa está
falando?
Vou ao dicionário e
procuro o verbete “verdade”. O Dicionário de Língua Portuguesa da “Porto Editora” traz:
Verdade: sf. 1) conformidade entre o pensamento ou a sua expressão e o objeto de
pensamento; 2) qualidade do que é verdadeiro; realidade; 3) exatidão, rigor,
precisão; 4) representação fiel; 5)boa-fé; sinceridade;6) coisa certa;
7)axioma, premissa evidente; 8)máxima.
Parece que “axioma”,
postulado, “premissa evidente” explicita melhor o que as pessoas querem dizem
com verdade no contexto em que estou
falando. Postulado ou premissa evidente é aquilo que pedimos para o outro
aceitar como verdade. É o início de um sistema de crenças, o fundamento de um
sistema científico ou o princípio de uma organiza religiosa, a base de uma
instituição. Um axioma não é algo que necessariamente exista, isto é, que tenha
existência palpável, perceptível, inquestionável. Ele é algo sobre o qual,
partindo do pressuposto que exista, eu fundamento o meu sistema de crenças.
Algumas sociedades
postulam que a mulher é inferior ao homem, depende da proteção dele e existe
para servi-lo e lhe dar filhos, e, com base nesse postulado, fundamentam o seu
sistema de tratamento dado às mulheres. Com base nessas premissas, evidentes
para eles, defendem a poligamia masculina, a prole numerosa, a submissão
absoluta da mulher e assim por diante. A inferioridade feminina é uma
verdade nessas sociedades.
Para algumas mulheres
todos os homens são traidores em potencial, frágeis diante da sedução feminina.
É um postulado delas e com base nessa crença ou premissa evidente para elas que
constroem o seu sistema de vida relacional centrado no ciúme, na desconfiança,
na “marcação passo a passo”.
Quando ouço, no
contexto religioso, alguém dizer que o outro não aceita a verdade, fico me
perguntando: a verdade de quem, isto é, o postulado de quem ele deve aceitar?
A instituição religiosa
à qual pertenço criou o seu sistema de crenças com base em postulados
formulados por ela e eu os aceitei, mas porque o outro também tem que aceitar?
Em que ele se torna inferior ou superior a
mim se não os aceitar?
Alguns defendem o seu
sistema de crenças ou postulados alegando maior proximidade com o que está no
texto bíblico ou maior proximidade com os escritos antigos ou ainda proximidade
com a tradição. Argumentos frágeis. A tradição pode ser mudada e nem tudo que é
tradicional é de melhor qualidade. Os escritos antigos também continham
equívocos, nossos antepassados também erraram em sua interpretação e nem sempre
houve preocupação com a ética ao produzir um texto. A “proximidade” com o texto bíblico pode ser influenciada, e
até prejudicada, pelos preconceitos,
pelas premissas de cada instituição.
Minha conclusão: a
verdade é institucional. É verdade para um a instituição.
Dirigir do lado direito
da rua é uma verdade na nossa instituição (legislação brasileira de trânsito),
mas não é verdade em outras instituições. No entanto, lá funciona tão bem
quanto aqui.
Diante do exposto,
afirmo que verdade absoluta, ampla, só existe para as instituições e como
premissa. Para nós como sujeitos existem verdades parciais, relativas, ou
melhor, verdades sobre ou como consta no dicionário: “conformidade entre
o pensamento ou a sua expressão e o objeto de pensamento”.
Exemplos: Conheço a
verdade sobre a minha história de vida. Presenciei o acidente, logo,
conheço a verdade sobre o que
aconteceu naquele momento. Falei a verdade, isto é, narrei os fatos conforme
percebidos pelos meus sentidos. Ouvi o fragmento de fala, logo, sei a verdade sobre
ele. Participei do projeto, então sei a verdade sobre ele.
Como não participei do
projeto da Criação do Mundo sei apenas a
verdade que me contaram. Embora eu acredite na integridade moral de quem me
contou não posso garantir que me contou todos os detalhes. Qual a verdade sobre
a criação do mundo? É aquela que me contaram.
Alguém dirá: mas a
verdade não é uma premissa evidente? Sem dúvida que é, mas toda evidência é construída.
Evidência não é, necessariamente, racional. É algo que alguém aceita como
evidente e me convida a aceitar também.
Pena que Pilatos (Jo
18:38) não esperou a reposta de Jesus. Talvez hoje tivéssemos outra
compreensão.
Antonio Sales profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 28 de
setembro de 2012.
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