Não vou
expor aqui o meu credo pessoal. Tecerei
algumas considerações sobre os motivos que nos levam a crer em algo. As conclusões deixo ao leitor.
Tomo por
base o relato de Asne (Hosna) Seierstad sobre a sua experiência como
correspondente de uma rádio norueguesa durante a guerra do Iraque. Ela estava
em Bagdá fazendo a cobertura do conflito. Chegou na capital iraquiana um pouco antes,
ficou durante e permaneceu um pouco depois dos ataques americanos.
Segundo
ela nas coletivas à imprensa, durante os ataques, o Ministro da Informação, o
porta-voz do presidente do Iraque, sempre reforçava que as forças invasoras
estavam sendo derrotadas pelo exército do seu país. Falava de helicópteros
inimigos tirados de circulação, de blindados americanos sendo destruídos, de
soldados americanos estirados sem vida no deserto e de nenhuma baixa no exercito
iraquiano. Na sua fala o exército iraquiano estava em vantagem e o inimigo, em
constante retirada e tendo baixas sucessivas.
Os
noticiários internacionais, por sua vez, enfatizavam o avanço das tropas
americanas, anunciavam a aproximação do desfecho final com vitória para as
forcas aliadas, noticiavam a tomada da capital.
Em quem o
povo acreditava? Qual a notícia que corria de boca em boca pelas ruas de Bagdá?
Em
conversa com a sua interprete, e através dela, Asne procurava saber o que o povo pensava, em
qual noticia acreditava. As pessoas sempre mostravam profunda convicção de que o ministro dizia a verdade, que o exército
iraquiano daria uma lição aos americanos e, especialmente, no presidente Bush que eles tanto odiavam.
Pessoas esclarecidas, universitárias, estavam
convictas de que o exército aliado se perderia no deserto e as forças iraquianas
o derrotariam.
Para elas
era mais confortador pensar que não seriam importunadas pelo invasor e as
mentiras do Ministro da Informação lhes trazia esse conforto. A incerteza do
que ocorreria se o país fosse invadido reforçava a necessidade de uma vitória
iraquiana. Portanto, elas criam no que lhes trazia conforto.
Um amigo da interprete, que desertou e trouxe
a notícia das derrotas iraquianas no deserto, não teve crédito. Ninguém queria crer nisso. Essa noticia não lhes
falava ao coração.
Não há racionalidade
na crença, há apenas sentimentos.
Soares-Vieira
(2012, p.70-71) em sua tese afirma que crenças são “ideias, opiniões e
pressupostos”. Crenças são filtros, diz ainda a autora.
Crenças
são filtros que nos protegem temporariamente ou que nos proporcionam fugas da
realidade. Crenças servem também para “explicar” o que não é explicável pela
ciência. Explicam o que eu gostaria que fosse e por isso, segundo Soares-Vieira,
as crenças são mutáveis.
A crença
traz euforia. Seierstad (Asne) (2007, p. 273-274) conta que suicidas iemenitas
se candidataram a servir no exército iraquiano e chegaram clamando: “a vitória
é sua Saddan”. “Viemos para derrotar o inimigo da humanidade: os Estados Unidos
[...] vamos esmagá-los”.
Dizemos
que os povos mais desenvolvidos economicamente são secularizados. Pergunto: são
secularizados ou racionais? Por terem suas necessidades básicas supridas, podem escolher em que acreditar,
podem filtrar as informações críveis das
não críveis, as racionais das voltadas
para o sentimento.
Os povos
que vivem próximos da linha da pobreza, com poucas perspectivas de sucesso econômico,
são mais crentes. Eles precisam de conforto, precisam de sonhos, necessitam acreditar
em algo para a autossustentação.
Nessas
condições a crença é produto da necessidade.
Antonio
Sales
profesales@hotmail.com
Nova Andradina,
24 de fevereiro de 2013.
Referências:
SEIERSTAD,
Asne. 101 dias em Bagdá. Rio de Janeiro. Record, 2007.
SOARES-VIEIRA,
Azenaide Abreu. Integração de
tecnologias e webtecnologias no ensino de língua inglesa: concepções
teóricas, crenças e interação na prática docente. São José do Rio Preto, SP: 2012 (Tese de doutorado
em Linguística Aplicada apresentada à Universidade Estadual Paulista. Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas).