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sexta-feira, 15 de novembro de 2013

A MEMÓRIA AUDITIVA




 O Dr Paul  Brand, cirurgião ortopédico, que atuou por muito anos como medico missionário na Índia, descreve com admiração, respeito e de forma quase poética os nossos sentidos. Com relação ao ouvido revela um profundo encantamento pelos ossos (martelo, bigorna e estribo) que intensificam os sons que recebemos e através de um meio aquoso o transmite ao cérebro. O ouvido dos animais tem ainda maior eficiência  do que nos seres humanos. A coruja, por exemplo, de olhos vendados, consegue perseguir e capturar um rato rastreando-o pelos sons emitidos por suas  patas ao correr no capim seco.
Mesmo tendo um ouvido mais limitado do que o deles ainda conseguimos distinguir os sons de duas buzinas diferentes, de dois carros de marcas diferentes e até mesmo saber qual  está mais próximo.
Ao terminar a sua exposição sobre o ouvido o medico fala da memória auditiva. Somos capazes de reproduzir, para o nosso consciente, sons ouvidos  em tempos anteriores. Durante dias continuamos a ouvir uma sinfonia executada por uma orquestra, o som do sorriso do nosso filho ou a voz da pessoa amada. Particularmente, constatamos que  durante anos ainda conseguíamos ouvir o som da corneta que ditava algumas ordens enquanto prestávamos serviço militar em  1965.
Diz o Brand: "não há nenhuma força, nenhuma vibração de moléculas, nenhum golpe sobre as células receptoras de som, mas ainda assim posso ouvi-los. Minha mente  recria os sons exteriores existentes, apenas no complexo  das células  nervosas comprimidas  em cada centímetro  cubico de massa branca".
Posso ouvir o que já foi ouvido, reproduzir esses sons. Isso é maravilhoso e assustador o mesmo tempo. Reproduzir os sons da corneta anunciando o rancho, o silencio ou a alvorada é extremamente agradável. Por outro lado, ouvir os toques de "em frente", "direita, esquerda ou meia volta volver" sob o sol escaldante de Corumbá (MS) não é tão agradável assim. Ouvir o toque de "acelerado", muito frequente naquele primeiro ano da "revolução" de 64, ou  quando a banda tocava a marcha de guerra, ainda acelerava  os batimentos cardíacos muito tempo depois desses sons estarem distantes, no passado.
Penso na vida. Penso em pessoas que após muito tempo ainda ouvem  os passos do progenitor bêbado chegando em casa, as condenações  emanadas de algum púlpito, as ameaças de algum  professor, os grito da mãe pedindo socorro ao ser agredida,  os xingos da mãe e a sirene do bombeiro que veio em seu socorro quando estava acidentado e sentindo o cheiro  da morte.
Penso nos cônjuges que durante todo o dia, mesmo distante, ouvem a voz condenatória do outro, as reprimendas e as intrigas. Penso nos apelidos de escola que focalizam exatamente os nossos pontos fracos. Penso na lavagem cerebral que se faz nos  jovens em algumas denominações religiosa e como muito tempo depois eles ainda ouvem as "denúncias" e murmurações sobre o mundo, as parábolas mal contadas para amedrontar, as ameaças de perdição e as acusações de que estão decepcionando a Deus.
Essa dor dura enquanto a lembrança durar. A insegurança que disso resulta não pode ser calculada porque as lembranças variam de pessoa para pessoa.  O que podemos fazer é evitar provocar tais lembranças em nossos filhos.
Antonio Sales             profesales@hotmail.com
Dourados, 28 de setembro de 2013.

BRAND, Paul; YANCEY, Philip. À imagem e semelhança e Deus.São Paulo:Editora Vida, 2007.
 

4 comentários:

  1. Mesmo que se faça tudo em que está ao nosso alcance em prol de nossos filhos, eles sempre tem o que reclamar, nunca estão contentes. Recordar o passado é sempre triste, mesmo que seja dos bons momentos.

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  2. Há verdade na sua fala. Nunca se está satisfeito plenamente, mas se possível, evitemos que as recordações sejam trágicas.

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  3. Creio que na memória de um bom soldado de Cristo está contida toda matéria que proporciona a paz e assim as tragédias serão evitada.Só não podemos esquecermos dos soldados do outro comandante.
    Muitas vezes as tragédias servem para provar o amor de muitos, e assim alguém subir um degrau na vida espiritual.
    Levando em conta a história de Jó, podemos analisar que muitas tragédias ocorrem pelo fato da pessoa ser digna e honrada diante de Deus.
    Devemos lutarmos para esquecermos o passado, principalmente os trágicos, porque nunca sabemos realmente o porque.
    Sales, mesmo que penso assim, não deixo de admirar a tua forte atitude de lutar para transpor montanhas.

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