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quinta-feira, 25 de julho de 2013

A LÓGICA DA EXCLUSÃO



O pastor era visitante. Pertencia à elite administrativa de uma organização religiosa não congregacionalista. Há uma hierarquia na instituição e ele estava a caminho do topo. Viera para ver o que  se passava com a igreja que, na sua perspectiva, estava  um pouco  "vagarosa", isto é,  não estava correspondendo aos padrões estabelecidos. Pelo visto o pastor local, pressionado pelo "pouco" resultado obtido em seu trabalho, "entregara" a congregação.
O superior imediato veio "ensinar" a igreja e, como de costume, tomou como ponto de partida um pretexto bíblico.  Começou com a triste história de Uzá (2Sm 6:7 ) o infeliz homem que tentando proteger a arca de Deus, para que não caísse do carro de bois, segurou-a e foi fulminado (no meu entender, pelo remorso resultante  de uma  educação religiosa  que intimida e sobrecarrega o sujeito de culpa; no entender dele, pela ira divina).
A lição que ele tirou e transmitiu a partir do texto foi:  para Deus ou se faz  bem feito ou não se deve fazer. Portanto, se você está aqui e não esta fazendo bem feito, se não está vivendo como se espera que viva está perdendo o seu tempo. Dizendo em outras palavras: vocês são uns estorvos ao progresso da instituição. Estão perdendo tempo e atrapalhando outros.
Curiosidade: toda congregação balançou a cabeça em sinal de aprovação.
O absurdo: ninguém tomou a reprimenda  para si. Ninguém supôs que era ele quem estava sendo convidado a mudar de vida ou  a se retirar. Nem mesmo o pregador suspeitou que o problema pudesse ser ele.
Esse é o problema (inclusive do pregador): supor que o problema sempre é o outro. Quando a mensagem é indireta então ela “atinge” os outros em cheio.  É sempre assim. Ninguém se encontra nessas mensagens obtusas. Quando se fala sem querer falar ou sem saber o que fala ninguém é beneficiado. Quando se parte de pretextos  para "lavar a alma" ou  fazer desafetos  com base em  ideias preconcebidas atira-se em todo mundo e não acerta em ninguém. Assusta, mas não atinge o objetivo. Acusa, mas não ensina. Aponta falhas, mas não diz como corrigi-las.
O maior absurdo, porém, foi ninguém ter percebido que essa logica é a lógica da exclusão e que a lógica da exclusão não é divina.
Jesus quando andou entre os homens acercou-se de rudes pescadores dispostos até a matar e aceitou a participação feminina,  uma categoria excluída na época. Como se isso não bastasse, o Mestre deu oportunidade a uma samaritana, desacreditada na sua aldeia (Jo 4), perdoou uma adúltera (Jo 8) e aceitou que uma outra pecadora O servisse (Mc 12).
 Atendeu um escriba que O procurou à noite (Jo 3),  perdoou o condenado que se arrependeu na última hora (Lc 23) e abençoou uma “imunda” que tocou em suas vestes (Mc 5:24-34). A lógica de Cristo era a lógica da inclusão.
Nós excluímos porque não sabemos ensinar, não sabemos tolerar e porque somos incapazes de tratar as pessoas com o respeito que merecem. Quanto menos competentes formos mais  excludente  seremos. A relação entre competência e exclusão é inversa.
Há, no meu entender, duas formas usadas por algumas igrejas para excluir:
a forma direta e a forma indireta.
Na forma direta a mensagem é agressiva, quase citando nomes, apontando erros, exigindo perfeição, reforçando o caráter exigente de Deus. É de exclusão porque expõe, inibe e proíbe.
Na forma indireta, os discursos enfatizam o medo e uma excessiva necessidade de cuidados. Apontam as possibilidades de erro ou fracasso "em cada esquina" e reforçam o mal existente no mundo, a constante piora deste, a decadência moral e a incapacidade humana de reagir. Com esse discurso criam o medo e a apatia. Intimidam e com isso excluem. Depois de conseguirem produzir a insegurança e apatia condenam o membro pela pouca iniciativa, pela sua timidez. Colocam-no em estado de letargia espiritual e social, incapacitam-no para as lutas e depois culpam pela apatia da igreja e o colocam sob a condenação de um Deus que espera ação.
A igreja deveria ser um lugar de inclusão porque deveria ser um espaço para educação e encorajamento. Ali as mensagens deveriam ser claras, bem fundamentadas, propositivas, acolhedoras (Mt 11:28-30) e atrativas (Jo 12: 32). Deveriam estimular, não condenar. Estimular boas práticas, ensinar como fazer, dar oportunidade aos inexperientes sem exigir perfeição, apoiar os fracos, estimular a tolerância dizer palavras de ânimo em todos os seus discursos.
Essa hipótese de que se deve fazer bem feito ou não fazer, é simplesmente absurda. Ninguém de bom senso erra porque quer. Erra-se por não saber fazer ou por faltar recursos  para um bom trabalho.
Os sujeitos faltos de senso critico ou de ética não encontram espaço em um ambiente de pessoas preparadas e honestas. Eles saem sem serem convidados, eles se autoexcluem como o próprio Judas.
Em um ambiente de pessoas esclarecidas, reflexivas, que aprenderam a exercer a prudência e que são livres para expor a sua opinião, os sujeitos mal intencionados ou incompetentes não ocupam espaço por muito tempo.
Se esses sujeitos estão se mantendo é porque a instituição não está cumprindo o seu papel de orientar e estimular boas práticas. O problema, portanto, é o pastor e a instituição, não as pessoas que frequentam a igreja.
Antonio Sales                       profesales@hotmail.com
Dourados, 17 de julho de 2013.

2 comentários:

  1. Sempre leio seu blog e nunca comentei, porém hoje não resisti. Também assisti a este mesmo sermão, acho que em outra ocasião, e também refleti neste jeito de “fazer sermão”, onde sempre estamos errados, desagradando a Deus.
    Penso que para nós a exclusão feita pela igreja já se tornou algo natural, porque já nos acostumamos em sempre estarmos errados, tendo em vista que este é o foco da maioria dos sermões.
    No meu entender, é quase “uma doutrina da igreja sermos os errados”, que pensar de uma maneira diferente, e principalmente fazer questionamentos é estar criando desordem.
    Gisele.

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  2. É isso mesmo Gisele. É doutrina. Aliás, penso que é uma doutrina, um dogma, gerado pela incompetência para ensinar. Ele revela mais a fraqueza de quem prega do que o "erro" de quem ouve. Penso também que muitos membros já estão experimentando a "Síndrome de Estocolmo, já estão dando razão para quem os fere, já não conseguem mais se ver como bons.
    Obrigado pela participação.

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