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sábado, 27 de agosto de 2011

Por que Ir à Igreja? -II

       
Já vimos no primeiro artigo desta série que não se justifica ir a igreja somente para adorar a Deus. É preciso encontrar outras razões. Falamos da necessidade que temos de aprender a viver como cristãos e a igreja deveria ser um lugar para ensinar esse viver. Essa perspectiva exige que os pregadores preparem sermões educativos. Sermões que não tenham o ranço da condenação e nem tome por base pressupostos ou postulados que “brotam” na cabeça, inconsequentemente. Exige pesquisa, vivência com o povo para sentir as suas angústias e uma boa formação moral e intelectual para não faltar com a ética, com a verdade científica e ainda não ferir os princípios mais elementares da lógica.
Entendo que uma segunda razão para ir à igreja seja a comunhão. Comunhão com os irmãos. Precisamos pertencer a um grupo que partilha da mesma fé, da mesma esperança, das mesmas crenças. Necessitamos sentir-nos aceitos com nossas crenças em algum lugar. A igreja é esse lugar. Sentimos falta de conversar sobre a nossa fé, de falar da nossa experiência cristã, de cantar hinos que outros apreciem também, de mostrar a Bíblia nova que compramos, de usar a nossa voz para cantar para um público que aprecia aquela música que nos faz bem. Temos necessidade de receber cumprimentos por termos aquela crença.
 Além disso, precisamos ainda de sorrisos sinceros, de abraços afetivos, de tapinhas nas costas, de uma conversa em particular com alguém, de fazer uma confissão a um amigo de confiança e assim por diante.
Os sermões poderiam ser mais curtos para sobrar tempo para um intervalo na programação para um “recreio”. Um suco, um bate-papo, uma brincadeira etc., por certo fará muito bem.
Alguns cultos poderiam ser abertos para um debate sobre um tema sobre o qual não temos certeza ainda. Já disse em um desses meus textos que as certezas não contribuem e são próprias dos que estão na prisão de um só pensamento ou na “gaiola” do dogmatismo.
Como seria bom se durante o “recreio” pudéssemos conversar sobre o sermão, questionar o pregador, abraçar o irmão que está abatido, fazer uma indicação de emprego para quem está desempregado, receitar um chá caseiro para quem está com algum mal-estar leve, orar com quem está triste, servir o suco para aquele irmão mais tímido, dar umas “dicas” para um casal com dificuldades de relacionamento e atualizar o “noticiário” da comunidade de crentes.  Parabenizar os aniversariantes, comemorar uma vitória alcançada por alguém do grupo, sorrir para  um idoso, abraçar um jovem e dizer-lhe palavras de ânimo.
Por que ficar no pátio conversando enquanto se desenrola o sermão é proibido? E se o sermão não estiver servindo para nada temos ainda que ouvi-lo? Será que a atenção de alguém, em determinados dias, não nos fará mais bem do que um sermão preparado com base em pressupostos falsos sobre as nossas necessidades? Não temos liberdade para escolher sentar no banco e ouvir ou ficar no pátio e sorrir? A necessidade é nossa ou do pregador?
Acho muito confusa as falas que ouço de vez em quando na igreja. Já ouvi alguém dizer que Deus não precisa de nós. Se é assim, por que então “ele” exige que fiquemos em a nave da igreja para ouvi-lo durante o sermão? Ele precisa que eu o ouça? Tem medo de ser abandonado?
Compreendo que Ele não quer que eu me perca, mas, forçando-me a ouvi-Lo, Ele me conquista ou me afasta?
 É por isso que eu tenho dúvidas se o pregador fala em nome de Deus. Penso que tem gente abusando da minha ignorância e fraqueza. Faz-me acreditar que fala em nome de Deus e ainda me intimida. Se é Deus quem fala pelos pregadores então:
1.      Ë preciso mandá-lo para a escola algumas vezes para aprender um pouco mais de ciência e falar menos bobagens.
2.      É preciso ensiná-lo a ter coerência no sermão. Por exemplo, temos  sermões tão cheios de contradições que a gente termina o culto perguntando: “o que o pregador quis dizer?”.
3.      É preciso incentivá-lo a ler mais para ter coisas novas a apresentar. Muitos sermões são repetições de tudo o que já se ouviu. Até as estórias são repetidas.
4.      É preciso ensiná-lo a ser ético para que não faça um sermão condenatório sem saber o que se passa com os irmãos. Deus não pode ter pressupostos falsos.
Preciso ir à igreja para me sentir bem. Não para me sentir confortável no sentido de acomodado, bajulado, etc. Sentir bem no sentido de ser aceito, ser orientado adequadamente e, se for repreendido, que seja uma repreensão justa. Uma repreensão que ainda que eu não  perceba a sua lógica no momento outros a percebam.
A igreja deve ser um lugar de acolhimento, calor humano, orientação adequada, partilha, sorrisos, abraços, afeto, tolerância, apoio, estímulo e muito mais.
Preciso ir à igreja sim, mas não a uma igreja qualquer. A uma igreja de crentes, de sábios e de pessoas bondosas. Preciso de comunhão.
Antonio Sales                                    profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 26 de agosto de 2011.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Por que Ir à Igreja?

           
Antonio Sales                                    profesales@hotmail.com
Tenho pensado nas razões que levariam uma pessoa a ir semana após semana à igreja. A questão que proponho inicialmente parece descabida e a resposta parece óbvia. “Vai-se à igreja para adorar a Deus” é a resposta mais simples.  “Vai-se à igreja porque é uma necessidade humana” é uma resposta mais elaborada. “Precisamos de Deus” é outra versão dessa segunda resposta. 
Minha pergunta é: a ida de uma pessoa à igreja tem somente Deus como foco? É a adoração o ponto central?
Se é assim (se o foco é a adoração a Deus) então o problema está resolvido: não precisamos mais ir à igreja. Sabe quem disse isso? O leitor imagina quem foi esse ousado? Resposta: foi Jesus. Leia João capítulo 4 e versículos 20 a 24. Disse Jesus quem nem no monte e nem em Jerusalém, mas em espírito e em verdade. Não é o lugar que importa, mas o espírito do adorador.
E então? Não precisamos mais ir à igreja? Não foi dito isso. Foi dito apenas que devem ter outros motivos para irmos à igreja. Só aquele apresentado não justifica. Quais os outros motivos? Pretendo discorrer sobre isso com detalhes nos próximos artigos, inclusive apropriando de um texto de Phillip Yancey que compartilharei com os leitores.
Hoje quero apenas discorrer sobre as dificuldades que encontramos para manter o entusiasmo das pessoas pelos cultos na igreja. Já discorri um pouco sobre a pobreza e inadequação dos sermões que brotam de alguns púlpitos evangélicos. Discorri sobre isso nos textos intitulados “Guias Cegos”. Quem vai à igreja precisa, além de adorar, ser “alimentado”.  Precisa da instrução que brota de um sermão coerente, praticável, consistente, ético e que, além de focalizar os aspectos espirituais da vida, focalize também aspectos relacionais e os problemas vivenciais. A igreja deve ser uma escola. Mas nem só de Bíblia vive o homem (exceto os pastores). Ele precisa gerenciar os conflitos familiares, educar filhos, saber lidar com o fracasso ou com o sucesso no trabalho, ser bom aluno, bom profissional. Isso requer um pregador competente, um pregador que saiba ir além de repetições de historietas mil vezes contadas, que saiba respeitar o tempo que o outro gasta ouvindo-o.
Já ouvi um sermão onde o pregador apresentava (e depois distribuiu a cópia impressa) uns trinta passos para o fracasso na vida espiritual. Mas eu queria saber os passos para vitória e não para o fracasso. Ao terminar tive vontade de gracejar com ele e dizer-lhe: “parabéns! Você realmente é um fracassado na vida espiritual e teve tanto sucesso nisso que sabe ensinar muito bem”.
Há outros que engrandecem tanto o poder do diabo que fica a impressão de que foi contratado por ele para fazer o seu marketing. E para completar tem os ataques a roupas, a modas, etc. condenando tudo o que as irmãs usam. Nesse caso fica a pergunta: se ele fosse mulher usaria o estilo de roupa que defende? Confesso que se fosse um pouco maldoso, ou suficientemente imbecil, eu receitaria colírio de pimenta para todos vocês. O que eu duvido é que eu usasse esse remédio.
Já ouvi pregador dizendo do púlpito que quando alguma irmã entra na igreja com certas roupas desvia a sua atenção do que tem de falar. Dessa vez eu não suportei e procurei-o para classificar o sermão como antiético, inoportuno, e disse-lhe ainda que  quem estava precisando de correção era ele.
Alguns dizem que os irmãos devem ficar em silencio refletindo. Pergunto: refletindo sobre o quê? Como educador sei que a reflexão é produto de algum desfio, de algum desconforto, da busca pela solução de algum problema. Se o sermão é uma repetição de tudo o que foi dito não há sobre o que refletir. Se é uma sandice é mais provável que provoque gracejos. Se é um elogio ao diabo deve ser esquecido logo. Se é sobre moda provoca mais ânsia de vômito do que reflexão. Ora, se ele quer que reflitamos dê-nos elementos para isso. Quando o sermão se baseia numa certeza, ainda que absurda, não há sobre o que refletir. Certeza não provoca reflexão; provoca silêncio em uns, frustração em outros e risos em outros. Certeza só a Matemática tem porque trabalha com seres abstratos.
É lamentável que os pregadores evangélicos ousem falar em nome de Deus. Imagino que, durante alguns sermões, Deus esconde o rosto na cortina do santuário de vergonha do que é dito em Seu nome. Ele deve pedir severas contas desses que se dizem teólogos e toma o tempo dos irmãos para não acrescentar-lhes nada. Se perguntarmos a um irmão, à saída da igreja, sobre que achou do sermão, por certo ele dirá que foi bom (está programado para dizer isso). Se perguntarmos o que aprendeu de útil para a vida (algo que vai praticar) é muito provável que dê um “sorriso amarelo”.
Claro que existem exceções, mas tem-se a impressão de que são poucas e quase sempre ligadas a emocionalismos.
Que razões encontramos para ir a igreja, além do costume e desencargo de consciência?
Discorrerei sobre isso nos próximos textos.
Nova Andradina, 22 de agosto de 2011.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Liberdade-III


Meus leitores já perceberam que não trato da liberdade física. Minha preocupação é com a liberdade da mente, com a capacidade de conviver com novas ideias, com a coragem de pensar diferente.
Conviver com uma ideia fixa é uma prisão; “a prisão de um só pensamento” (CHESTERTON, 2008, p.102). Viver nesse mundo pequeno (de um só pensamento) é pensar o universo como ainda estando na casca de noz.
O que caracteriza uma prisão física, metáfora da prisão da mente, é que sempre se vê as mesmas paredes sob os mesmo ângulos e percorrem-se sempre os mesmos corredores. Um prisioneiro da mente alimenta, durante anos, os mesmos medos, cultiva sempre as mesmas preocupações e julga sempre pelos mesmos critérios.
Na prisão mental cultiva-se a ideia de completude e a completude apequena. O “presídio” é o seu espaço mais amplo, não há mais para onde ir. Lá “fora” a vida estagnou. Novas aprendizagens não fazem sentido. Para que estudar o universo se as paredes frias são tudo o que existe para ele?  
Nesse universo amesquinhado repetem-se as mesmas frases já desgastadas e o discurso não sai do lugar comum. O prisioneiro põe a possibilidade de expansão sob rigorosa guarda, dogmatiza o que poderia ser opcional e com isso estreita ainda mais os horizontes, admite que a verdade esteja só de um lado e com isso encerra o diálogo, decide a priori e, dessa forma, inibe a ousadia. Seu mundo é uma fantasia, como é uma fantasia o “lago” de um peixe criado no aquário.
O livre, por outro lado, sabe que quem faz uma estátua grande pode fazer também uma estatueta (CHESTERTON, 2008). Quem agiu de um modo pode agir diferente e quem redigiu um texto pode dizê-lo também em outras palavras. Sabe que não há limite para a criatividade humana e que Deus não se contenta com a mediocridade.
Sabe também que os males da vida devem receber tratamentos diferenciados. Quem sofreu um acidente precisa de repouso para ser curado e quem foi vítima de um golpe financeiro deve agir duplicadamente para recuperar o prejuízo. Quem está com virose precisa ser paciente e quem sofreu uma falcatrua precisa ser impaciente (CHESTERTON, 2008).
Só a liberdade permite compreender essas metáforas.
Tenho um colega que é professor no Instituto Federal de São Gabriel da Cachoeira (AM), cidade situada na região que no mapa se parece com a cabeça de um cão. Dizia-se ter vindo da “cabeça do cachorro” para estudar em Campo Grande. Segundo ele, cerca de noventa por cento da população daquela cidade é constituída de indígenas de diversas etnias.
Com ele aprendi que entre os índios não se costumava encontrar gêmeos ou pessoas com alguma deficiência. Não porque não nascessem, mas porque tais crianças eram abandonadas na mata para serem devoradas pelos animais selvagens. Em caso de gêmeos, o mais frágil era o amaldiçoado.
Prisioneiros “de um só pensamento” esses índios não conseguiam conviver com as diferenças. Não sabiam o que fazer com tais pessoas e não estavam dispostos a pensar em outras possibilidades. Todo diferente era uma maldição.
Os prisioneiros da mente veem o demônio em todo lugar e inspirando todas as ações que discordam do modelo concebido por ele (pelo prisioneiro). Essa prisão impede de respeitar e amar. Mas, mas para apoiar é preciso amar. Para mudar é preciso apoiar, para apoiar é preciso acreditar e pensar em outras possibilidades.
Múltiplas são as razões para viver, servir, amar e adorar.
Einstein era um homem livre e a ele é atribuída a frase: “a mente que se abre para uma nova ideia jamais voltará a ser a mesma”. Um gênio nem sempre é alguém com um alto quociente intelectual, mas sempre será alguém que permite que sua mente se engravide com novas ideias. Não há problema que a gravidez seja de gêmeos, pode ser de gêmeos múltiplos e de “sexos” opostos. O importante é pensar, ousar, admitir outras possibilidades.
O conhecimento se expande, a tecnologia se aperfeiçoa e facilita a vida cada vez mais, a sociedade se transforma e melhora na distribuição da justiça, a fé se robustece e o amor se manifesta em sua verdadeira essência, unindo sentimento e ação, graças às pessoas de mente livre.
Jesus alertou aos prisioneiros fariseus da necessidade de uma mente livre. Ele disse: “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (Jo 8:32). Ele falava da  verdade de que a vida é complexa, que as possibilidades são múltipas, que Deus não é indiferente aos progressos humanos e não corrobora a mesmice.
Abro parêntese. “Ouço” as vozes dos prisioneiros “de um só pensamento” relacionando liberdade com promiscuidade e dizendo: a liberdade não pode produzir danos morais?
Para eles só há um sentido para a palavra liberdade: irresponsabilidade.
Os livres sabem que liberdade é a disposição para conjeturar e para conviver com o diferente; é potencialidade para conceber que a verdade pode ter mais de um lado. Fecho o parêntese.
A leitura é a chave que abre as janelas e portas da prisão da mente. Uma leitura direcionada, de um único gênero literário, abre uma janela. Ilumina a cela, mas não permite ver o movimento fora daquele minúsculo espaço. É a leitura de variados gêneros que abre as portas em toda a sua amplitude.
“Ler é preciso”, afirma Genival Mota em cada mensagem que manda.
CHESTERTON, G.K. Ortodoxia. São Paulo: Mundo Cristão, 2008.
Antonio Sales

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A Família Cristã Derruba o Muro de Separação e Constrói a Ponte do Perdão

  Meu amigo Genival Mota é Licenciado em História, Jornalista profissional e Mestrando em Literatura Comparada. Leitor inveterado é estudioso das Escrituras Sagradas e sempre nos brinda com sermões expositivos que levam à reflexão. Acredita que a leitura tem poder libertador e aposta no potencial dos jovens. Coordena e dirige há doze anos o Projeto de Vida que já encaminhou dezenas de jovens ao mercado de trabalho e incentivou-os a prosseguir nos estudos. Há dezesseis anos mantém em funcionamento o Jornal Âncora, com a colaboração dos amigos.
Mente brilhante, tolerância invejável, visão arguta e crítico capaz, Genival
leu o meu texto sobre o Filho Pródigo e mostrou uma outra visão do mesmo texto bíblico em um sermão que transcrevo abaixo, com a sua permissão.
É um brinde ao leitor.

A Família Cristã  Derruba o  Muro de Separação e Constrói a Ponte do Perdão

Texto: Lucas 15:11-31

Introdução: O Escritor russo Leon Tolstói, começa o seu livro Ana Karenina com a seguinte afirmação: “Todas as famílias felizes são parecidas entre si. As infelizes são infelizes cada uma à sua maneira”.
            Hoje nós vamos analisar na Bíblia o caso de uma família que é sempre estudado focando em primeiro plano o filho mais novo, em seguida o pai e por último o primogênito.
            Nós do Projeto de Vida nos propomos a expor este texto de uma perspectiva diferente. Vamos analisar o contexto da família: Como ela era feliz; como se tornou infeliz e a difícil tarefa na reconstrução da felicidade perdida. E era uma família como muitas hoje, em que o pai e Pãe, faz papel de pai e mãe.
Nosso tema é: Derrubando  o Muro da Separação, Construindo a Ponte do Perdão

Vamos abrir a Bíblia e ler Lucas 15: versos de 11 a 13
I –  A CONSTRUÇÃO DO MURO VISIVEL NUMA FAMÍLIA QUE ERA FELIZ:
Nestes versículos percebemos o surgimento de um muro visível de separação numa família que aparentemente era feliz. Havia  recursos materiais, vários empregados faziam os serviços domésticos  e a família era  pequena, composta apenas de três pessoas.
  • Tudo indica que o pai e os dois filhos desta família eram tementes a Deus. Podemos dizer que iam aos cultos da Sinagoga; Conheciam a vontade de Deus expressa em Sua Palavra;
  • Mas de repente, aconteceu uma surpresa na família. O caçula pede uma reunião familiar e exige a parte que lhe cabia na partilha dos bens. A pressa em se apossar da herança começa a revelar o caráter do filho mais novo da família;
  • Este desejo já estava há um bom tempo no seu coração. Uma pessoa não cai subitamente na situação descrita nesta parábola. Aquilo aconteceu aos poucos, quase sem que ele percebesse, estava sendo dominado pela cobiça...
  • O  desejo de liberdade sem ser vigiado pelo pai ou pelo irmão mais velho, é também seu grande anseio. Ele não pediu a sua parte para investir em alguma área, ou montar sua empresa. Ele quer o dinheiro  para ir embora de casa e para um lugar bem distante;
  • Já que estamos falando em muro de separação, a falsa liberdade é o alicerce desse muro. Ter os amigos que ele quisesse sem censura de nenhuma pessoa. ‘Afinal ele já era dono do seu nariz e sabia com quem devia se relacionar”, pensava o  rapaz;
  • Desfrutar dos prazeres são as paredes do muro. Ele estava com vontade de beber com os amigos sem ter ninguém por perto para proibir; praticar sexo sem se casar, sem compromisso; chegar em casa a hora que quisesse, sem pressa de levantar no outro dia...;
  • Muros de separação ás vezes são construídos pelos pais, pelos filhos, por  parentes mais próximos e até por pessoas de fora do círculo familiar;
  • “Partiu para uma terra distante”. Muro implica em colocar distância entre o outro. Quando o muro é sentimental, com vistas a impedir relacionamentos, geralmente quer que a outra ou as outras pessoas fiquem bem distantes. Por isso o filho pródigo foi para uma terra longínqua;
  • Quando o muro se estabelece na família, as pessoas ficam distantes. Não acontece o diálogo. Aqui o muro construído pelo jovem foi radical. Ele não queria nem ver as pessoas. Ele queria conviver com pessoas bem diferentes da sua casa.

ILUSTRAÇÃO:
Escolha uma ilustração que você achar melhor para esta primeira parte.


Segunda Parte –versículos 14 a 19
II – O SOFRIMENTO E O ARREPENDIMENTO DERRUBAM  O MURO
a-      O alicerce da falsa liberdade começou  a ser abalado. No início parecia que era o paraíso: Comprar roupas e sapatos novos; Comprar passagens para chegar na maior cidade do país; Andar de primeira classe  e pagar carregadores para levar as malas;
b-      O dinheiro atraiu muitos “amigos”. Mandava servir comida e bebida para todos e pagava a conta. Era só alegria. Mas logo tudo acabou e as pessoas se afastaram dele. Quando veio a crise ele estava sem dinheiro. Como no sonho de Faraó, as vacas magras devoraram as vacas gordas. Isto significa que o jovem não se preparara para os momentos difíceis da vida. Dificuldades que ele próprio criara;
c-      A primeira lição que aprendemos aqui, é a possibilidade de um novo começo, a partir do arrependimento.
d-     Ele, o filho pródigo, chegara ao fim dos limites máximo da decadência. Caiu tanto que não podia descer mais. Chegou no fundo do poço. Que quadro pode ser mais desesperador? Num país distante, em meio aos porcos, sem dinheiro e sem amigos, totalmente abandonado e sem esperanças;
e-      A segunda lição é que devemos enfrentar a situação com honestidade, assumindo nossos erros, falhas, e culpa na causa do problema...
f-       Diz o texto que o jovem “caiu em si”. Foi exatamente o que ele fez. Ele enfrentou a situação e o fez com sinceridade. Compreendeu que seus problemas eram resultados exclusivos de suas escolhas;
g-      Compreendeu que ele fora um tolo. Não deveria ter abandonado a casa do pai. Ele olhou para si mesmo e mal conseguiu acreditar no que viu. Olhou para os porcos e as bolotas à sua volta. Encarou a situação de frente;
h-      Aquele jovem olhou para si e não para os outros. Ele poderia ficar colocando a culpa nos falsos amigos e nos falsos amores. Mas ele olhou para suas mãos – estavam sujas com o pecado; olhou para seus lábios, não estavam puros; olhou para seus pés, viu que haviam trilhado os caminhos do pecado;
APLICAÇÕES:
  • Falo agora neste momento para os adolescentes e jovens: se você causou algum problema na sua família, levantou um muro de separação, já olhou para si mesmo? Já pensou na tolice que você fez, desobedecendo e até deixando a casa de seus pais à procura de uma falsa liberdade?
  • Enquanto você não assumir a sua parte de culpa no problema, enquanto ficar procurando culpados pelo que você fez, o problema vai só aumentar;
  • Olhe para si mesmo. Então olhe à sua volta, para sua posição e o ambiente que você freqüenta. Não fuja da avaliação! Seja honesto;
  • Do que você está se alimentando? Coisas que alimentam o espírito ou de bolotas lançadas aos porcos? Você é um ser humano criado à imagem de Deus. Não aja como um animal irracional;
  • Não adianta ficar se lamentado, reclamando da sua sorte. É preciso levantar-se e voltar para o ambiente da sua família. Pare de enganar a si mesmo;
  • Peça força a Deus. O fato do jovem “ter caído em si’, ou seja, de se conscientizar da burrice que fizera, foi obra do Espírito Santo. Mas se ele não abrisse o coração e fosse orgulhoso, ao ponto de querer negar onde estava e porque estava ali, continuaria junto com os porcos;
  • O Deus que criou a Instituição família é o mesmo que pode ajudar a derrubar o Muro da separação e construir a Ponte da União;
  • Temos que ter humildade. Quando o pródigo abandonou o lar, sua exigência foi: “Dá-me”! Ele exigiu seus direitos. Estava cheio de autoconfiança  e até mesmo de presunção, sentindo que ainda não estava recebendo tudo a que tinha direito. Mas quando ele “caiu em si” e quis voltar para casa, o seu vocabulário mudou e o que ele diz agora é: “Faze-me como um dos teus empregados”;
  • Antes ele sentira que era “alguém” e que estava na posição de exigir direitos  dignos da sua pessoa. Na situação em que se encontrava, depois das decisões erradas que tomara, se sentiu reduzido a nada; começou a derrubar o muro que criara;
  • Se quisermos construir a Ponte do Perdão na família, temos que ter humildade e reconhecer nossos erros;


Terceira Parte -versos de 20 a 24
III – O PERDÃO DO PAI CONSTRÓI A PONTE DA ACEITAÇÃO
  • “E levantando-se foi para seu pai”. Cair é fácil, difícil é levantar-se. O próprio Apóstolo Paulo adverte em uma de suas cartas: “Quem está em pé cuidado para não cair”.
  • O jovem não ficou só na intenção de levantar-se, ele tomou mesmo a decisão e levantou-se e foi. Não ficou pensando na vergonha que seria voltar daquele jeito deplorável que se encontrava. Nem o que as pessoas pensariam ou como reagiriam ao seu retorno;
  • Ele “foi para seu pai”  porque o conhecia. Sabia que ele era um homem que falava com os filhos e ouvia os filhos. Aqui está a chave: sabemos que todas as famílias enfrentam problemas. Mas as famílias que conseguem superar as tempestades causadas por um de seus membros ou mesmo por pessoas e acontecimentos externos, são aquelas que mantém um relacionamento de respeito mútuo. Onde os pais deixam o filho falar e externar seus sentimentos;
  • Famílias que usam da repressão, da força, da imposição, quando surge um problema, o filho fica em dúvida se vai ser recebido de volta. Precisamos fortalecer o diálogo e o respeito em nossa família. Precisamos nos fortalecer para enfrentar os tempos de crise. 
  • “Vinha ele longe ainda, quando o pai o avistou”. Isto mostra que o pai orava pelo seu retorno e estava preparado para recebê-lo. Os pais precisam ter disposição para perdoar. Isto não é uma coisa natural em nós, é um dom de Deus. Precisamos buscar a casa dia o dom do perdão, porque Deus nos perdoa todos os dias quando nos arrependemos; O pai não perguntou do seu passado;
  • “E, compadecido dele”. O pai estava numa posição bem superior a do filho. Estava bem vestido, alimentado e era respeitado pelos empregados. Mas não usou de sua superioridade para repreender o rapaz ou humilhá-lo, falando de seu estado deplorável. Ou perguntando onde estava o dinheiro que ele tinha recebido como herança. Não, ele teve compaixão de ver o filho naquele estado, e alegria por ter voltado. O filho ainda não havia falado nada, mas a sua atitude era de confiança na aceitação do pai e arrependimento pelo que fizera;
  •  “Correndo, o abraçou e o beijou”. Imaginemos a cena: um senhor, já de idade, corre, sua capa esvoaça ao vento, e feliz abraça o filho longamente e lhe dá um beijo expressando todo seu carinho e alegria pelo seu retorno. Correr é ter pressa. Os pais precisam ter pressa em reconstituir a família. Precisam ser construtores de Pontes de União. Ele o beijou como fazia antes do filho partir;
  • O filho fez três coisas: levantou-se e fez o caminho de volta, confessou ao pai seu arrependimento e assumiu sua indignidade. Ele queria começar de novo;
  • O pai fez quatro coisas: Aguardou-o, teve compaixão dele, abraçou-o e o beijou e supriu suas necessidades. Esperava ser tratado como um servo. O pai fez mais;
  • Deu-lhe a melhor roupa, tirou as roupas rasgadas, símbolo de seu passado; colocou-lhe um anel no dedo, para selar, indicando reconciliação e autoridade; sandálias nos pés, dizendo que ele era livre, o escravo na época andava descalço; mandou matar o novilho cevado, o animal preparado para ocasiões e convidados especiais; e deu uma festa, restabelecendo a alegria, a comunhão e a união;
APLICAÇÕES:
  • Como teria sido ridículo se o filho  pródigo tivesse se limitado a pensar tudo aquilo, sem colocar em prática. Pensar em levantar-se e continuar sentado; ou levantar-se, mas não caminhar em direção ao lar; ou caminhar mas não tivesse coragem para chegar até lá; ou vendo o pai e virar as costas e voltar para os porcos; ou indo ao pai e não confessar e assumir seu erro;
  • Assim também não adianta você durante esta pregação da Palavra de Deus, estar sendo tocado pelo Espírito Santo, mas ao sair daqui, não firmar a decisão de seu um filho, ou um pai, ou mãe, construtor de Pontes de União na sua família e em outras;
  • Mas o filho agiu. Nós também precisamos agir. Não pensar que esta mensagem, esta pregação serve muito bem para a família A, B ou C. Olhe para você e sua família. Descubra o que precisa melhorar para que ela seja mais unida;
  • Se fizer isso, haverá um novo começo para a sua vida em família, como aconteceu no caso do filho pródigo;


Quarta Parte – versos de 25 a 32
IV – O MURO INVISÍVEL SE MANIFESTA NO ÓDIO DO FILHO MAIS VELHO
  • “Vindo também este teu filho que desperdiçou os teus bens com meretrizes”. Observe a severidade, o ódio com que o filho mais velho falou ao pai. Ele não chama o outro nem de seu irmão. Lembra o comportamento de Caim? Disse ele: “Acaso sou eu guardador de meu irmão”. Assim como o filho pródigo mostrou seu verdadeiro caráter quando pediu a sua parte da herança, agora o filho mais velho começou a mostrar o seu egoísmo, rejeitando o retorno do irmão;
  • Ele como mais velho, deveria estar alegre. Mas ficou carrancudo e se recusou a participar da festa;
  • Quando o pai se encontrou com o filho pródigo, não tocou no seu passado. Mas o filho mais velho foi a primeira coisa que fez e falou de forma grosseira. Lembrou ao pai que o mais novo gastou  todo o dinheiro (teus bens) do pai com as prostitutas. Jogou na face do pai o passado do irmão. Ele já estava culpando o próprio pai pelos erros do mais novo;
  • “Tudo o que é meu é teu... o teu irmão estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado”. O pai demonstrou o seu caráter de conciliador. Não discutiu com o filho. Procurou abrir os olhos dele. Ele precisava tirar os olhos e os interresse das coisas e voltar para o valor da pessoa humana;
  • Muitas famílias estão em crise hoje, porque valorizam mais as coisas do que as pessoas. Trabalham demais, correm atrás para  adquirir bens, e quase não têm tempo uns para os outros. Não há diálogo, e quando a crise se instala na família, as pessoas não são capazes de conversar, ouvir a opinião diferente do outro. Como não tem discurso, partem logo para a agressão verbal e física;
  • “Nunca me deste um cabrito se quer para alegrar-me com os meus amigos”. Ele gostaria de fazer como o mais novo, só não teve coragem. Não que o filho pródigo tenha agido certo, como já vimos. Mas o mais velho cometia o pecado na imaginação, escondia do pai suas verdadeiras intenções;
  • Possivelmente nunca pedira ao pai um cabrito. O pai evitou falar nisso para não gerar discussão. Falou para ele que tudo que ele tinha era dele.
  • “Há tantos anos que te sirvo sem jamais transgredir uma ordem”. Ele fazia por obrigação, não por amor. Agora estava exigindo como salário, não um cabrito, mas que o filho mais novo, que ele nem ousava em chamar de irmão, fosse expulso da casa. Esse era preço que ele exigia. Não aceitava o que havia errado;
  • O filho mais velho era tão orgulhoso, que se fosse ele que houvesse deixado a casa, possivelmente por orgulho viveria na miséria até morrer, mas não aceitaria a vergonha do retorno. Os fracos são orgulhosos, só os fortes têm a coragem de se arrepender;
  • Se fizermos uma comparação entre estes dois filhos e os discípulos Pedro e Judas, poderíamos dizer que o mais novo agiria como Pedro e o mais velho seguiria o exemplo de Judas;
  • Pedro errou negando  Cristo três vezes, se arrependeu e chorou amargamente diz a Bíblia e Jesus o Perdoou. Assim fez o filho pródigo desperdiçou tudo, se arrependeu, voltou e foi aceito pelo pai. Judas traiu, vendeu Cristo, sentiu remorso, não perdoou a si próprio e enforcou-se;
APLICAÇÕES:
  • Derrubar o muro da separação e construir a ponte da união na família não é tarefa fácil. Sempre surge oposições internas ou externas. Os membros da família têm que unir as forças para promover e manter a união no lar.
  • É preciso a determinação e autoridade moral e espiritual como a desse pai de família da parábola contada por Cristo. Ele demonstrou que não tinha preferência por algum dos filhos, como queria sugerir o mais velho;
  • Outra verdade que aprendemos desta história é  que várias forças atacam para destruir a harmonia familiar. Primeiro os prazeres do mundo encheram os olhos do filho mais jovem até fazê-lo sair de casa. Depois o ódio e a covardia do primogênito, na rejeição do retorno do que havia errado;
  • Precisamos estar unidos a Deus e dEle pedirmos forças para que nossa família, se está em crise, possa vencê-la. Se estiver unida, esteja preparada para enfrentar e vencer as tempestades que virão.
Sermão Escrito por Genival Mota na semana de 26 a 29 de maio de 2008



CONCLUSÃO

APRENDEMOS NESTA PARÁBOLA PELOS MENOS QUATRO LIÇÕES:

I – A FAMÍLIA CRISTÃ NÃO ESTÁ LIVRE DE PROBLEMAS:
  • Aquela família conhecia a Deus;
  • O pai era uma pessoa cristã e os filhos também;
  • Não era uma família numerosa e nem pobre;

II – A FAMÍLIA CRISTÃ BUSCA EM DEUS A SOLUÇÃO PARA SEUS PROBLEMAS:
  • Aquele pai orava todos os dias pelo seu filho que saíra de casa;
  • O pai esperava todos os dias a volta do filho;
  • O pai jamais se desesperou;

III – A FAMÍLIA CRISTÃ RECEBE DE DEUS A RESPOSTA ÀS SUAS ORAÇÕES:
  • Deus usa a força da natureza para  atingir o coração dos membros da família que saiu do lar;
  • Deus usa o Seu Espírito Santo para tocar no coração dos membros da família;
  • Deus dá energia e coragem para os filhos fazerem o caminho de volta;

IV – A FAMÍLIA CRISTÃ PODE TER SUAS ESTRUTURAS ABALADAS, MAS DEUS A RECOMPÕE:
  • O filho voltou;
  • O Pai o recebeu;
  • O irmão mais velho foi convencido a aceitar o retorno do irmão;

APELO:
  • Converse mais com sua família sobre a necessidade da união dos membros;
  • Quando surgir alguma crise apresente a Deus;
  • Creia no poder do Deus que criou a família para mantê-la unida e vitoriosa;
  • Todos os membros da família devem ser construtores da PONTE DA PERDÃO!

domingo, 14 de agosto de 2011

O Filho Pródigo



 O evangelista Lucas registra a parábola, contada por Jesus, sobre o filho de um rico proprietário que abandonou a casa paterna e foi viver como julgava deveria ser a vida (Lc 15:11-32). Depois de um período de frustrações com a escolha que fizera o jovem voltou implorando perdão ao pai e solicitando acolhida. Foi recebido com alegria pelo pai, mas não pelo irmão mais velho. Este detestou a festa dedicada ao irmão e se recusou dela participar.
Esta história criada por Jesus para ilustrar o amor de Deus, forjada para enfatizar a disposição divina em acolher os que erram, contada para dizer que Deus não joga em rosto as nossas tentativas frustradas e que foi elaborada para nos dizer que ninguém vai tão longe que não possa contar com o amor de Deus, frequentemente, é usada por pregadores para intimidar os jovens, cercear-lhes a ousadia e mantê-los sob a prisão do medo.
Dizem esses pregadores que a parábola ensina que todos que se afastam do lar, da religião ou das orientações dos “rabinos”, voltarão andrajosos implorando misericórdia. Pura mentira.
Com essa interpretação contrariam a própria Bíblia, pois no Salmo 73 o nobre cantor de Israel diz ter inveja do que se afastam da religião porque eles prosperam.
Nossa experiência nos mostra que não se pode dar garantias absolutas quando se trata de decisões humanas. O julgamento deve levar em conta os motivos que levaram o jovem à decisão e não a decisão em si. Qualquer decisão pode dar errado, qualquer uma pode ser a melhor para aquele momento.
Jesus não apresentou em detalhes os motivos que levaram o jovem a sair de casa, apenas diz que pediu a sua parte da herança e partiu. Com isso deixou margem para que cada leitor faça a sua interpretação. Eu vou apresentar a minha leitura.
Que motivos teriam o jovem para sair de casa?
Penso que vida na fazenda era rotineira. Não exigia criatividade, ousadia. Tudo estava pronto. A administração era do pai e os serviços poderiam ser executados por qualquer pessoa. Ele queria algo dinâmico, queria participar, fazer algo novo, propor, ousar, etc.
Talvez alguém me dissesse: tudo bem, mas por que não inovou em casa? Por que teve que sair?
Minha resposta é: com aquele irmão mais velho ranzinza, atravancador de projetos, você se atreveria em tentar alguma mudança?
Lembre-se que, na cultura da época, os irmãos mais velhos mandavam, eram os principais herdeiros de tudo. Ali não havia espaço para ele a menos que derrotasse literalmente o irmão. Entre assassinar o irmão e sair de casa, a segunda opção foi a menos prejudicial para a família, a menos traumática.
O conflito entre eles está evidente no final da parábola e o pai parece que não se posicionava, era o tipo bonachão. Como assim? Perguntará o leitor, irritado. Se o pai representa Deus como você se atreve em dizer que não se posicionava?
Foi exatamente isso que Jesus fez quando alguém O procurou para julgar um caso de herança (Lc 12:13,14). É assim que Deus tem agido conosco quando temos problemas relacionais. Cada um tem que resolver os seus próprios problemas com o próximo. A sociedade tem que criar os seus mecanismos de mediação de conflitos. Concordo com Yancey quando diz:
Por que Deus permitiu que Hitler fizesse tanto mal, ou Stalin ou Mao? Por que não desempenha um papel mais ativo na história humana? Eu consigo pensar em várias razões. De acordo com o Velho Testamento, Deus de fato desempenhou um papel ativo e convincente no passado, e no entanto não conseguiu produzir uma fé duradoura entre os israelitas (YANCEY, 2010, p.279)

O jovem resolveu o problema do seu modo e, se não havia uma receita, como posso condená-lo por isso?
Muitas adolescentes engravidam por irresponsabilidade, mas quantas delas não o fazem como uma tentativa de fugir da tirania paterna ou da falta de expectativa da vida que levam no ambiente em que os pais as obrigam viver? Muitas engravidam para fugir de uma vida sem significado.  A vida não é simples e somente os simplistas têm receitas prontas, condenação na ponta da língua, saídas “fantásticas” para os problemas (dos outros).
Mesmo entre as adolescentes que engravidam por irresponsabilidade muitas experimentam uma transformação radical na vida. Tornam-se responsáveis, melhoram o relacionamento com a família, voltam a estudar e procuram trabalho. Muitos pais ganham as filhas depois delas “se perderem”.
O pai disse: “estava perdido e foi achado”. O jovem já estava perdido antes de sair de casa e foi achado antes de voltar para casa. Ele foi achado quando “caiu em si”, isto é, foi achado quando “se achou” estando entre os porcos.
Evidentemente que não estou estimulando atitudes extremas, estou refletindo sobre as suas implicações. Quero apenas dizer que sempre se corre riscos: em casa ou fora dela. Fora há o risco do “acidente” e dentro, o risco da nulidade.
Nem todos que “se perdem” são casos perdidos desde que a família saiba acolher quando houver retorno. Dificilmente alguém procura o caminho de volta para casa se ela for um lugar pior  do que aquele onde ele está. Por isso a parábola está centrada no pai e não nos filhos.
Por que o jovem saiu de casa? Queria ser empreendedor em outro lugar? Supôs que os amigos pudessem orientá-lo uma vez que em casa não havia diálogo? Aprenderia fora o que não aprendera em casa? Ficam as perguntas sobre os motivos, fica a certeza sobre o fato.
A certeza é que ele foi amado pelo pai, quando voltou, e odiado pelo mesmo irmão que, no meu entender, foi a causa da sua partida.
Há ainda nessa parábola mais algumas lições a serem aprendidas:
1. Não há perdidos a priori. Cada um se perde quando quer se perder. Perde-se dentro ou fora de casa.
2. Poucos “se perdem” propositadamente. Eles estão perdidos apenas porque não conseguem “se achar”. E se você, pai, não souber provocar a autobusca terá o filho perdido para sempre.
3. Deus está de braços abertos para o filho que retorna de suas aventuras mal sucedidas. E eu, sei acolher o filho que volta?
4. A “casa paterna”(casa de Deus), isto é, a igreja  nem sempre é um lugar agradável. Os irmãos “mais velhos” costumam provocar desconforto pela sua intolerância e intromissão, pela insegurança e medo de perder o espaço.
Esses irmãos “mais velhos” consideram-se guardiões da verdade e controlam tudo. Muitos ditam normas que nem eles cumpririam se fossem ditadas por outros. São inseguros e preferem a acomodação à ousadia.
 O irmão mais velho do pródigo fingia estar tudo bem. Era um hipócrita que agradava o pai por interesse de manter-se no poder.
Conviver com hipócritas não é saudável. Provoca irritação ou sufocamento. Os que se conformam não crescem e os inconformados ficam estressados.
5. Experiências amargas e aventuras frustradas pode ser o início de um encontro com vida significativa, para muitos.
6. Biologicamente podemos afirmar que “filho de peixe é peixinho”, embora haja exceções como no caso dos híbridos. Socialmente, “filho de peixe” pode ser “sapinho”, “baratinha” ou até mesmo um “grilo”. Filhos de pais honrados podem não guardar essa característica. Filhos de Deus podem ser demônios e filhos das trevas podem vir a irradiar luz. Os filhos de um bom pai procederam, cada um, ao seu modo.
Preocupa-me quando vejo pessoas que se dizem sábias ou que se colocam à frente dos jovens para transmitir certezas que não existem.  Eu só tenho uma certeza: sou amado por Jesus.
YANCEY, Philip. Para que serve Deus: em busca da verdadeira fé. São Paulo: Mundo Cristão, 2010
Nova Andradina, 13 de  agosto de 2011.
Antonio Sales
profesales@hotmail.com

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O Melhor Pai do Mundo


Era o “Dia dos Pais” e os jovens fariam uma homenagem a eles. Como precisavam de alguém que fizesse o discurso vieram até mim para incumbir-me dessa tarefa.
Eu não tinha outros compromissos e aceitei o desafio. Para me situar melhor no contexto da programação quis saber o que esperavam da mensagem, qual a ênfase que gostariam que desse.
Surpreendidos com a pergunta um deles sugeriu que falasse sobre o “melhor pai do mundo”.  Pronto, tinham me colocado em uma enrascada. Eu não tinha condições morais e nem intelectuais para desempenhar tal tarefa. Não sendo bom pai não tinha moral para ensinar os outros a sê-lo. Se não era bom pai porque não sabia como ser então também não tinha condições intelectuais para ensinar.
Disse-lhes que não poderia assumir esse compromisso por questões éticas. Eles arriscaram outra sugestão: “fale sobre Abraão”. Enquanto pensava em como escapar dessa situação os jovens foram embora e deixaram-me com o problema nas mãos. No dia lá estava eu com o discurso pronto. Um discurso obtuso, algo cômico, algo melancólico, um discurso indefinível. Procurei escapar de algum possível questionamento posicionando-me “em cima do muro”. É esse discurso que transcrevo aqui em “homenagem” aos meus colegas que são pais.
“Falar sobre o melhor pai do mundo é uma tarefa descomunal, ingrata. Pois, o que é ser bom? Não sei responder a essa pergunta. O próprio Jesus respondeu-a com um exemplo. Quando um jovem o chamou de bom mestre, Ele disse: ”bom só há um que é Deus” (Mar 10: 17 e 18). Ele não disse o que é ser bom e nem porque não Se considerava bom. Apenas escapou da classificação, saiu pela tangente.
 Ora, se não sei o que é bom, como saber o que é melhor? Logo, se me perguntarem qual o melhor pai do mundo vou dizer que SOU EU. Se me perguntarem por que, minha resposta será simples e simplória: considerando que não sei o que é ser bom, mas supondo que seja bom ser bom, e considerando ainda que quero estar entre os bons, digo que sou bom.
E, se ser melhor, é melhor do que ser bom eu quero ser o melhor. Ponto final. Explicação concluída.

Sou como uma criança que não sabe o que é ser bonita, mas suspeitando que é bom ser bonita decide que é bonita.
Bem, mas o que é ser bom? Já disse que não sei, mas como quero ser bom tentei conjecturar o que seria ser bom, isto é, bom pai.
Um bom pai, suponho, sabe ouvir antes de opinar. Ele leva em conta o contexto em que a conversa fluiu ou o fato aconteceu antes de julgar.
Um bom pai, em minha  opinião,  é forte em sua convicções mas sabe que o outro também pode ter razão. Que o filho às vezes também está certo naquilo que diz e na opinião que dá. O bom pai sabe que a sua verdade não é absoluta embora possa ser a melhor naquele momento. Ele sabe ainda que os filhos  também nos ensinam pois ninguém é tão estúpido que não sabe nada e depende  que tudo lhe seja ensinado.
Um bom pai não se deixa abater pelas crises familiares. Não se acovarda diante das dificuldades, mas sabe que não conseguirá resolver todos os problemas e nem compreender tudo o que se passa em sua família.
Um bom pai não perde a calma, mas sempre assume o comando quando a crise se aproxima.
Um bom pai sabe buscar ajuda e admite que, se buscou ajuda, deve experimentar os conselhos que lhe deram.
Um bom pai sabe que o filho tem direito de aprender e por isso não se exaspera com os pequenos erros, ou deslizes, cometidos por ele. Pois errando também se aprende. Não estou falando do erro estúpido, agressivo, praticado com o fim de agredir o que quer que seja. Estou falando do erro da procura, da tentativa de acerto que não deu bem.
Há também o erro da revolta pela forma com que se é tratado que é uma forma de tentar acertar ou mostrar o seu desagrado pela forma injusta com que se está sendo considerado.
O bom pai fica atento a isso. O erro do filho é o erro estúpido de uma rebeldia sem causa ou o erro da busca de alternativas e superação de uma crise pessoal ou familiar?
Enfim, o bom pai sabe que tem todos esses deveres, mas sabe que também tem direitos. O direito de ser ouvido antes de ser julgado como antiquado ou coisa que equivalha.
O direito de descansar quando está cansado. O direito de saber por que o filho demorou chegar a casa. Não aquela demora de cinco minutos, evidentemente, mas ele sabe que a demora desproporcional precisa ser esclarecida.
O direito de saber por que o filho não está indo bem na escola e porque a família está gastando o que gasta. O direito de dizer “não” quando precisar dizer “não” e o direito de  não ficar sendo questionado  quando avisou que  a decisão é definitiva.
O bom pai conhece esses direitos e exige o respeito a eles.
Um bom pai, quando precisar dar a última palavra, dará a última palavra.
Temos muitos exemplos do passado. Nem sempre temos informações suficientes sobre o contexto em que viveram para podermos usá-los como modelos de pais. Abraão foi o pai da fé, um exemplo de fé, mas não sei se foi um exemplo de pai, pois o contexto em que viveu foi outro, a família era outra, a sociedade esperava dele, como pai,  diferente do que espera de nós hoje.
A religião que professamos hoje nos impõe certas normas diferentes do que era imposto naquela época. A informação que os filhos têm disponível hoje nem de perto se compara com aquela época.
A posição da esposa e mãe na sociedade atual quase não tem nada a ver com a posição da mulher daquele tempo. Portanto, Abraão é um bom exemplo de patriarca, de homem de fé e de visão administrativa. É um bom exemplo de moralidade, mas é um bom exemplo de pai e esposo? Não sei.
Ele é louvado por ter encarregado o servo Eliezer de conseguir uma esposa para o filho já adulto. Hoje uma atitude dessas seria um fiasco.
Ao pensar na vida desses homens do passado a lição que temos que é aprender é: eles fizeram o melhor que poderia ter sido feito no seu tempo e por isso foram bons pais.
Se fizermos o melhor que nos é permitido fazer em nosso tempo seremos bons pais também e serviremos de exemplo para futuras gerações.
O que nos resta  dizer agora é que um bom pai é aquele que:
1. É honrado pelos filhos ( Êxo 20).
2. É capaz de se amar. Ou melhor, está de bem consigo mesmo (Mat 22: 39).
3. Não provoca a ira dos filhos, mas aos admoesta com respeito, sem impor os seus caprichos pessoais (Efés 6:4).
4. Não irrita os filhos, pois está bem situado no seu tempo sabendo que o ontem não é o hoje. Sabe que cada dia é um novo desafio e que a incerteza é sua companheira inseparável. Apesar disso, tem projetos para os filhos, não desanima com as teimosias e reticências e aposta no filho até o último momento. Sabe que, se os valores éticos e morais devem ser mantidos, os procedimentos podem e devem ser alterados Col 3:20, 21”.
Confesso que não fiz quase nada disso. Falhei quase cem por cento, mas tenho bons filhos e por isso considero que sou um bom pai. Sou bom pai não por ter feito por merecer, mas por receber o que não mereço. Sou bom pai não porque desempenhei bem a tarefa, mas porque o resultado saiu bom apesar do fraco desempenho.

Sou como a criança que, ao ser acariciada pela mãe, julga ter a mais bela mãe do mundo e, sendo acariciada, considera-se uma criança bonita.
Prezado colega pai. Faça o seu melhor, esforce-se para ser cada vez melhor e você será o melhor pai do mundo, para os seus filhos.
Parabéns pelo nosso dia.
Nova Andradina, 12 de agosto de 2011
Antonio Sales
profesales@hotmail.com

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Inversão de Valores


Não é raro ouvir alguém dizer que vivemos em uma sociedade cujos valores estão na ordem inversa. Alguns fundamentalistas religiosos procuram intimidar os jovens para que não estabeleçam relações com pessoas que não sejam da mesma fé por entenderem que  tais pessoas vivem sob a influência dessa sociedade de valores invertidos.
Sempre tive dificuldades em identificar o que há de errado com a sociedade, ou com esses discursos, em relação aos valores.  Se for verdade que presenciamos uma inversão de valores então é de se supor que em algum tempo no passado esses valores estiveram ordenados e forma correta. Quando ocorreu isso? Em que ordem estavam os valores quando estavam corretamente ordenados? Em que a inversão atual é prejudicial?
Que  algumas pessoas tenham os seus valores pessoais invertidos em relação ao contexto social onde vive parece ser fácil de observar. É para evitar que essa distorção se alastre que existe a educação. A igreja também deveria contribuir com a educação para que tivéssemos menos pessoas vivendo na contramão dos valores sociais vigentes.
Dizer que a sociedade como um todo está com os seus valores invertidos é uma expressão dúbia, nebulosa, porque não se diz em relação a que, ou em relação a qual época, se faz a afirmação.
Tudo que não tem uma referência não permite uma avaliação. Se não é apresentada uma referência como saber se o discurso está correto ou não?
Da minha parte, fico tentando adivinhar o que querem dizer com isso. Procurei pensar como seria a ordem correta dos valores e para isso percorri meus fragmentos de  história. Como não sou acadêmico da área de história ou de sociologia não possuo texto completo ou algum autor de referência. Tenho que trabalhar com os fragmentos que minha precária cultura escolar me proporcionou.
Mesmo com essa deficiência intelectual, e bibliográfica, penso que é possível tecer algumas considerações sobre um assunto tão importante. Não discutirei o que é valor e como ele se constrói. Vou direto ao ponto: o discurso  da inversão.
1. Desde que se tem notícia, ou o que os meus fragmentos históricos me contam, os homens (gênero masculino) sempre ocuparam posição de destaque em relação à mulher. Ele dava ordens, podia repudiá-la e podia “educá-la”, isto é, domesticá-la à chicotadas. Na família ele era o chefe e ela era a subalterna. Ele o livre e ela, a dependente. Talvez encontremos algumas exceções ao longo do tempo, mas são “pontos fora da curva”. A regra era: o homem mandava e mulher que tinha juízo obedecia. Penso que essa era a ordem “correta” no relacionamento entre homem e mulher. Era a ordem historicamente construída a partir dos primeiros seres humanos.
A superioridade do homem era um valor inquestionável, um bem inestimável. Algo que o homem não queria e nem poderia perder.
Em algum ponto da linha do tempo, porém, alguma coisa começou a mudar e hoje ela fala de “igual para igual” com ele, tem identidade própria, administra empresas e já chegou à presidência de alguns países.
Ora, se a ordem “correta” dos valores é o homem mandar e a mulher obedecer então tem uma inversão aí, não tem? Hoje ela manda e milhões de homens obedecem.
2. Naqueles tempos de valores ordenados “corretamente” a criança não era objeto de preocupação. Se fosse um filho homem, ainda trazia um pouco de esperança e alegria para os pais. Se fosse “ela” restava a expectativa de arrumar um bom casamento, com alguém que pagasse um dote.
Escola, para que? Criança tinha era que trabalhar para pagar o seu alimento e ajudar a pagar o alimento dos irmãos menores.  Direitos? Ela (a criança) tinha sim o direito de apanhar em silêncio ainda que fosse espancada por simples capricho do pai.
A ordem “correta” da relação era a hierarquia: homem, mulher, filhos.
Tem algo diferente hoje. Criança tem direitos, ela estuda e tem que ser tratada com respeito. Será essa uma das inversões tão questionadas?
3. Os reis, príncipes, nobres e senhores feudais podiam tudo. O povo não podia nada. Eles tinham servos, cavaleiros de honra, ditavam as regras e tinham direito à lealdade dos seus súditos. Ao povo cabia ter que se contentar em cumprir ordens, dever favores, aceitar humilhações, enfim, viver de favores. Hoje o povo faz greve, recorre à justiça, requer salário digno e atenção básica de saúde, pede segurança e escola para os filhos. Talvez essa inversão de valores esteja incomodando. Talvez achem estranho que os “nobres” devam favores ao povo.
4. O que se passava nos arredores do palácio era sigilo. Somente os mais chegados sabiam da humilhação que as mulheres passavam no harém. Os nobres (não) se enriqueciam ilicitamente. Eles (não) praticavam a corrupção. Ninguém ouvia falar da exploração sexual de meninas. Uma ou outra mulher “fofoqueira” deixava escapar alguma coisa, transmitindo o seu grito sufocado de socorro para ouvidos que não ouviam. Hoje a imprensa escancarou as portas do palácio, denuncia a corrupção e expõe perante o público as mazelas da “nobreza”.  Será isso uma inversão de valores?
5. Os reis herdavam o trono por determinação divina. Eles eram os filhos dos deuses e a voz deles era a voz de deus. Hoje, no regime democrático, a “voz do povo é  a voz de deus”. A seta indicadora de direção está invertida, não está? Agora  a ordem é outra, não é mais aquela ordem “correta”.
6. Os reis eram os mandatários supremos. Destituíam a quem eles queriam, sufocavam rebeliões, massacravam multidões. O trono era inatingível pelo povo. Hoje, os “caras pintadas” saem às ruas e forçam o impeachement de um presidente. Isso está na ordem “correta”?.
7. No passado os pais eram os sábios da família. Eles conheciam o mercado, faziam negócios, iam à cidade, etc. Portanto, os únicos bem informados e os donos da verdade em casa. Atualmente os filhos estudam e questionam a sabedoria dos pais. Deve incomodar um pouco essa inversão.
8. Os pais (os homens) faziam o que queriam e eram inquestionáveis. Vemos na atualidade filhos pequenos questionando os pais quando ultrapassam o sinal vermelho ou não usam o cinto de segurança.
Quando ingressei na carreira do magistério logo me vi envolto em debates sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e sobre  a proteção de animais. Estranhei profundamente tudo isso. Parecia que o caos estava se instalando. Estavam brigando por direito dos animais e por direitos dos alunos, mas,  e os direitos da gente onde ficavam. Gente para mim eram o professor e os pais. Aluno não era gente, criança não era gente. Proteger animal não era coisa de gente. Eu não entendia que a proteção dos animais vai além da discussão ecológica, no seu aspecto físico, tem muito a ver com a ecologia social. Quem acaricia um cão dificilmente chuta uma criança. Que protege um animal terá mais facilidade para cuidar do seu próximo. Uma sociedade que protege os indefesos animais, por certo, protegerá os seres humanos também.
Espera-se que uma criança protegida da violência seja uma defensora da paz. Crescerá sem ódio, sem desejo de vingança e, supostamente, defendendo as outras crianças.
Os valores estavam, de fato, se invertendo naquela época e apanharam-me de surpresa. Os seres humanos estavam sendo violentados nas favelas cariocas e as ONGs defendendo os animais? Tudo parecia confuso, mas hoje está claro que sempre se começa por algum lugar. Hoje eu sei que algo tem que ser feito para quebrar a rotina, mudar a ordem vigente para iniciar um novo caminhar. Eles quebraram a ordem e agora a diferença já pode ser vista.
Talvez o leitor consiga se lembrar de outros casos de inversão de valores que possam estar incomodando e provocando esses discursos nebulosos e também possa estar se lembrando de alguma experiência sua em que foi preciso quebrar a ordem vigente para mudar o rumo da história.
É evidente que existem dezenas de outros fatores e inúmeras inversões que parecem não ter surtido os feitos esperados. Hoje, por exemplo, somos muito mais estressados. Bem, isso é o que dizem. Tenho cá minhas dúvidas. Será que o homem, chefe de família, que servia a um feudo não tinha estresse? Será que a vida sem perspectiva e a provável investida do senhor “contra” a sua esposa, enquanto ele trabalhava, não lhe dava estresse? Talvez não porque sem conhecimento não há conflitos íntimos (ver artigo sobre conhecimento e certeza), a ignorância anestesia, mas era isso que queríamos para nós? Será que não preferimos o estresse?
Bem, o certo é que não havia “volantes assassinos”, “cruzamentos perigosos”, bêbados no volante, etc., mas será que o que existia não era pior? A “peixeira”, a espingarda e as tão comuns vinganças familiares que dizimavam famílias seriam algo melhor do que os acidentes de hoje?
O certo é que não estamos bem. Muito há ainda para melhorar, mas, o leitor acha mesmo que estamos piores? Todas as inversões foram para pior?
Eu não gostaria que minha filha e minhas irmãs tivessem vivido naqueles tempos tão saudosos para muitos.Prefiro vê-las neste tempo de valores invertidos.
Antonio Sales
profesales@hotmail.com
Nova Andradina 10 de julho de 2011