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sábado, 6 de agosto de 2011

A Regra ou a Exceção?


Antonio Sales
profesales@hotmail.com
Há um ditado popular segundo o qual “toda regra tem exceção”. Verificaremos a validade dessa  afirmação no campo das ciência sociais.
Na Matemática ela é falsa. A matemática, tendo como objeto de estudo e trabalho seres idéias, entes abstratos, criou um “mundo” especial. Nesse mundo os seres relacionam-se perfeitamente. Os “pontos fora da curva” são prontamente excluídos, restando apenas aqueles que se adéquam às normas criadas pelo matemático. Por essa razão um teorema, uma vez demonstrado, é inquestionável. Nesse “mundo” não há mesmo exceção à regra, mas por isso mesmo a Matemática não deve ser tomada como um modelo social. Ela é um modelo de exclusão, inaceitável no relacionamento humano.
A sociedade não pode conviver tranquilamente com a exclusão e por essa razão é de se esperar que as regras sociais tenham exceção. Para incluir é preciso tolerância, paciência, investimento, aposta no outro. E, partindo desse princípio, temos que aprender a conviver com as exceções. Não há perfeição absoluta e nas relações humanas, nem todo “sim” deve permanecer “sim” e nem todo “não” deve ser eterno.
Sempre que uma regra trouxer mais prejuízos do que benefícios é preciso ser repensada e, enquanto isso, quem a administra deve ter bom senso para abrir exceções sempre que precisar. Nisso está a dificuldade em julgar certos procedimentos.
Mentir, por exemplo, nem sempre é errado. Um exemplo hipotético, para ilustrar essa afirmação:
Um navio de pesca legal é bombardeado, por engano, em alto mar. A tripulação é resgatada e os marinheiros decidem levá-la perante as autoridades do país cuja marinha bombardeou o navio. Durante o trajeto e depois da tripulação ter sido maltratada o equívoco é descoberto. Temendo a reação das autoridades diante da imprensa internacional o comandante da marinha propõe ao comandante do navio bombardeado que ele assine uma declaração de que estava fazendo pirataria em águas do outro país e que foram bem tratados durante o trajeto. Se assinar a declaração ele e seus homens ficarão presos e responderão judicialmente pelo crime. Se não assinar todos serão executados e lançados no mar. Os homens olham sulicantes para o seu comandante e ele abaixa a cabeça, toma a caneta e, com mãos trêmulas, assina a declaração. Mentiu.
E você, assinaria a declaração ou permitiria que seus companheiros morressem?
Mentir é sempre errado?
Há exemplos do cotidiano em que a exceção é mais prudente do que fazer o certo (as ambulâncias em serviço não respeitam o sinal de trânsito, por exemplo) e assim a regra de que “errar é sempre errado” tem suas exceções.
Mas uma regra não pode ter mais exceções do que preceitos válidos. Nesse caso, o que deve prevalecer: a regra ou as exceções? Pergunto melhor: se as exceções superam (ou pelo menos igualam) os preceitos da regra, essa regra tem ainda razão de existir? Em casos como esses, deve prevalecer a regra ou as exceções?
Uma ilustração.
Mesmo sabendo que toda ilustração tem suas limitações atrevo-me a apresentar uma. É uma parábola.  
Suponhamos que uma importante estrada tenha uma curva.


De repente alguém cria um espaço de tráfego fora dessa curva e que encurta a distância.

Depois outro espaço ainda é criado.


E assim a estrada fica com mais espaço trafegável fora da curva do que na própria curva.
Resta a pergunta: a curva da estrada ainda existe?
Aqueles que quiserem manter a curva terão que responder às seguintes perguntas: para que a curva? A quem interessa a sua permanência? Para que investir na conservação dessa curva?
Enquanto o leitor procura decifrar o enigma da estrada vamos discutir a validade do adágio popular. Se a regra é que “toda regra tenha exceção” então qual a exceção dessa regra?
A sociedade moderna sofre transformações em ritmo acelerado. As necessidades humanas mudam e as relações se alteram em decorrência dessa mudança. As regras, portanto, são mutáveis. Devem ser questionadas e atualizadas periodicamente. Todas as regras? Não.
Algumas regras são universais e devem ser eternas. Podem não estar sendo respeitadas em alguns lugares ou por algumas pessoas, no entanto, mais cedo ou mais tarde elas “emplacarão” e os transgressores pagarão pelo erro de não respeitá-las. Mesmo que o pagamento seja póstumo, mas a sociedade um dia os terá por bárbaros, indignos de terem vivido.
O respeito pelo outro, a defesa da vida, a promoção do bem-estar de todos, a dignidade humana acima de todos os interesses, eis os preceitos de uma regra universal e eterna. Essa regra não tem exceção.
Campo Grande, 06 de agosto de 2011.

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