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sábado, 29 de junho de 2013

O PROBLEMA É SEMPRE O OUTRO?



As mensagens de autoajuda cristã que recebo pela internet (leio menos de 10% delas) quase sempre vêm apelando para que eu reconheça a necessidade de uma mudança em minha vida, e mais especificamente em meu modo de pensar, caso eu deseje ter sucesso espiritual.
Não se trata de discordar da validade da mensagem porque realmente necessitamos reordenar nosso modo de pensar continuamente. Novos conhecimentos trazem novas concepções e como consequência uma nova forma de ver o mundo se faz necessária. Um novo olhar se torna imperioso a cada dia.
Bauman (2013, p.10) mostra essa necessidade ao falar da mixofilia que está sendo impulsionada pela migração intensa que provoca uma miscigenação sem precedentes. Portanto, entendo ser ponto pacifico que devemos nos livrar das amarras mentais.
O problema é quando se parte do pressuposto de que é o outro quem deve mudar para se adequar às minhas interpretações. É problemático quando suponho que o preconceituoso é o outro, o retrógrado é o outro, o hipócrita é o outro, quem está no caminho errado é o outro, enfim, quem tem que fazer ou sofrer ajustes é o outro.
A última que li tratava do camelo que se sentia amarrado porque o seu tratador fingiu fincar uma estaca no chão e simulou atá-lo a ela. O apelo que veio em seguida foi: "E você? Está preso a algumas amarras mentais? Crê que não pode seguir em frente? Melhorar sua saúde, seus relacionamentos, sua vida? Pare de acreditar que está preso a uma doença, problemas no trabalho ou qualquer situação ruim, livre-se das amarras é possível seguir adiante".
Fiquei pensando na origem da mensagem. Por que foi enviada  a mim? Suponho que quem a enviou  talvez nem tenha pensado que eu necessite realmente dessa mudança. Quis apenas divulgar a ideia, o apelo, que possivelmente tenha lhe feito bem.
Mas porque ele se dirigiu a mim dizendo: "E você? Está preso a algumas amarras mentais?”.
Por que não disse: “preciso verificar se não estou amarrado a processos mentais desatualizados. Preciso ver se comigo não ocorre o mesmo que com o camelo”?
Saramago (citador por MAZZEO, apud BAUMAN, 2013, p.12) disse que todos nós sabemos o que é preciso fazer, mas nem sempre estamos dispostos a fazer. Por vezes nem mesmo queremos aprender como se faz ou justificar para nos mesmos porque devemos fazer.
Não é necessariamente o outro que está  necessitando rever os seus conceitos ou superar os seus preconceitos. Muitas vezes sou eu quem precisa sofrer os ajustes. Um problema sério consiste em nos esquecermos de que estamos vivos, logo, sujeitos a erro. Quem está caminhando sempre está em perigo de ter perdido o rumo.
Só os brutos não se perdem porque o relento é a sua casa, o instinto é o seu guia, a genética é o seu padrão, a sobrevivência é a sua ética e a procriação é a sua moral. O ser humano sempre pode estar errado.
Por que sempre apelar para que o outro mude?
 Nova Andradina, 29 de junho de 2013
Antonio Sales      profesales@hotmail.com

BAUMAN, Zygmunt. Sobre  Educação e  Juventude: conversas com Ricardo Mazzeo. Rio de Janeiro, Zahar, 2013.

 

2 comentários:

  1. Hoje apelo para que vc mude, amanhã vc apela para que eu mude e assim estamos colaborando um com o outro. Creio que seja assim os apelos. Nem sempre enxergamos nossos erros.
    Perder o rumo isso é realmente difícil. Só a misericórdia do SENHOR JESUS.

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  2. Na perspectiva cristã, os judeus do tempo de Cristo perderam o rumo.

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