Translate

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

VAMOS TRANSGREDIR?-II

É possível que ao usar o termo transgressão eu tenha causado mal-estar em algum leitor. Isso é compreensível se levarmos em conta  que transgressão, na nossa cultura, sempre esteve ligado a desobediência a Deus ou a algum deslize moral. Transgressão soa como maldade, ingratidão, perversidade.
Penso diferente. Para mim a vida cristã não se resume em pecar ou não pecar, obedecer a lei moral ou desobedecer a lei moral. Entendo a vida como algo mais amplo e mais complexo. Ela não é binária, do tipo certo ou errado.
Viver é um fenômeno multifatorial e as possibilidades de viver moralmente bem vão muito além de obedecer a lei dos dez mandamentos que,  no meu entender, nem deveria mais fazer parte do “cardápio” cristão.
Penso que há  múltiplas formas de transgredir sem ser imoral.
(Antes de prosseguir convido o leitor a ler o texto “errar é humano” postado neste mesmo blog (http://apontandocaminhos.blogspot.com/2011/07/errar-e-humano.html)).
Um aeroplano transgride a lei da gravidade sem ser imoral, um jovem estudioso transgride  a lei do comodismo sem ser imoral, um homem honesto transgride a lei da corrupção sem ser imoral, as mulheres transgrediram lei do machismo sem se tornarem imorais, um adicto abandona  o uso da droga sem ser imoral. A lista parece  infinta, mas o que importa é que podemos transgredir muitas leis sem cairmos na imoralidade. É para essa transgressão que convido o leitor.
Convido o leitor para a ousadia de pensar por si mesmo, para perder o medo de Deus, para sair da mediocridade, para superar o preconceito. Convido-o para tanta coisa que nem sei enumerar. Convido-o para sair da repetição de palavras já proferidas milhares de vezes  por outras pessoas. Convido-o a ler a Bíblia por si mesmo ou com ajuda de múltiplos comentaristas, isto é, para sair do domínio intelectual de alguém.
Convido-o a não ter medo de errar e aqui novamente cito o artigo “errar é humano”que deve ser lido como complementar a este texto.
Conforme já disse, a vida não é binária. Não é regida pelo sim e não. Ela é regida por escolhas muitas vezes mutuamente exclusivas, mas nem sempre contraditórias. Temos que escolher porque não há espaco (emocional, intelectual, físico, moral, legal) para as duas.
Um exemplo: um jovem tem admiração por duas garotas e sabe que qualquer uma delas lhe seria uma boa companhia. Ele deve escolher entre uma e outra porque no nosso código de ética não há espaço para as duas. No entanto, ao escolher uma ele não está dizendo que ela é melhor do que a outra ou garantindo que fez a escolha mais acertada. A outra escolha poderia ser igualmente boa.
Outro exemplo: um jovem gosta de ciências exatas e está para escolher entre estudar Física ou Matemática. Ele deve escolher porque não há espaço para (espaço de tempo para estudar) as duas e não porque uma seja melhor do que a outra. Infelizmente muitas religiões nos levam a pensar na vida como sendo binária: salvo ou perdido, amado por Deus ou rejeitado por Deus, bom ou mau, bem ou mal,  Deus ou o diabo e assim por diante. Será que entre o salvo é o perdido não há gradações? Será que entre o bom e mau não há o bom que faz mal e o mau que faz bem? Uma quimioterapia é algo bom ou mau? Ela faz bem ou mal?
Doce é bom e faz mal para tanta gente. Glútem é bom, mas tem gente que não pode comer. Entre o casado e o solteiro existe o namorado, o noivo e a união estável. Por que reduzir a vida a duas dimensões apenas se ela  é multidimensional? Existem jovens que não estão na igreja e nem no “mundo”, existem pessoas que saem na rua nem vestidas e nem nuas, durante o ano letivo o estudandte não está nem aprovado e nem reprovado, durante a minha trajetória  cristã há momentos nos quais não estou salvo e nem perdido. Momentos em que estou em processo de redefinição das minhas prioridades, das minhas crenças e das minhas relações com Deus.
Ao convidar o leitor para transgredir convidei-o para sair da linearidade, do binário e do discurso repetido. Nunca conviei e nem convidarei quem quer seja para a imoralidade.
Escrevi parágrafos acima que os dez mandamentos não deveria mais fazer parte do “cardápio” cristão. Com isso não estou dizendo que que foram abolidos ou coisa semelhante. Estou dizendo que um cristão não deveria necessitar que alguém lhe dissesse para não matar, não adulterar, etc.  Um cristão que aprendeu a respeitar o outro faz algo mais do que não matar: ele apóia, incentiva e orienta.
Os pregadores que ainda pregam os dez mandamentos para os seus membros estão admitindo  que falharam em educá-los ou então que a graça não transforma.
É isso leitor que eu disse quando o convidei a transgredir.
Nova Andradina, 25 de novembro de 2011. 
Antonio Sales                                       profesales@hotmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário