É difícil definir o amor, mas quero crer que todos tenham o conceito do que seja ele. Essa ideia de amor como sendo o gostar desinteressadamente de alguém ou da divindade parece ser de domínio público.
Penso que haja dois níveis de amor: o amor-sentimento e o amor-em-ação. Um é contemplativo, reflexivo e resulta do respeito que se tem pelo outro. O outro (amor-em-ação) resulta da preocupação com o bem-estar do objeto amado e da seriedade com que conduzimos as nossas relações sociais.
O amor–sentimento assim com a oração, não é panacéia. Ele não cura infecções, não cicatriza feridas, não evita a violência e não acalma o irritado. O amor-em-ação pode fazer tudo isso porque ele não se limita a palavras ou expressões faciais de afeto, ele produz ação. Ele mobiliza a busca pela solução do problema. O amor-em-ação é o amor-sentimento acrescido de responsabilidade social.
Entendemos que amar é uma arte que pode ser aprendida. Para desenvolver essa capacidade alguns requisitos pessoais precisam ser preenchidos. Dentre eles destacamos:
1.Gostar de si mesmo. Isso significa ter superado fracassos. Ter aprendido a perdoar-se pelos erros não-intencionais cometidos. Ter entendido que nem todo mal que lhe aconteceu foi por culpa sua e que, em algumas circunstâncias, os seus próprios erros foram provocados por outros. Enfim, é preciso ter autoestima.
Quando Jesus disse “amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22: 39) estava dizendo que não ama o próximo quem não se ama.
2. Não esperar do outro mais do que um ser humano pode oferecer. Como por exemplo: preencher o nosso vazio existencial, estar a postos em todo momentos, não cometer erros, sorrir sempre, não ter oscilações de humor, entre outros.
Todo ser humano tem seus limites. Limites físicos, emocionais e afetivos, financeiros, intelectuais, etc. Aceitar as limitações humanas (não a má vontade, os vícios, o mau caráter) é condição necessária para desenvolver a arte de amar.
3. Aceitar as diferenças. Redundantemente podemos dizer que há diferença entre admitir as diferenças e aceitar as diferenças.
Admitir as diferenças é um assentimento intelectual, é saber que os outros são diferentes de mim. Aceitar as diferenças é permitir que o outro goste de coisas diferentes das que eu gosto. É tratar com o mesmo respeito (e depois amar com a mesma intensidade) o mais calmo e o mais agitado. É não exigir que o outro tenha as mesmas perspectivas que eu.
4. Respeito. Este item engloba os outros dois que o precedem, porém, ele é mais amplo e vai além de aceitar as diferenças. É fazer valer os direitos do outro. Não apenas aceitar as diferenças, mas admitir que ele tem o direito de ser e defender o seu direito de mantê-las. Vai ainda mais além. Implica em respeitar as regras sociais que proporcionam bem-estar ao outro. Há normas sociais que estabelecem direitos individuais, são direitos objetivos, tais como: liberdade de falar, de ir e vir, de ter o seu salário ou mesada, a sua religião própria e assim por diante. Há diretos subjetivos, que não estão expressos em lei, mas que devem ser respeitados também. Por exemplo: errar enquanto busca a solução de um problema, pensar antes de responder a uma inquirição, guardar segredo, romper com o seu passado, omitir informações que o fragilizem, dormir tranquilo após um dia de trabalho, projetar o seu próprio futuro, gostar de coisas que eu não gosto e ser respeitado em suas diferenças.
Talvez caiba aqui um parênteses para explicar ao leitor que em nenhum momento pensamos em defender o direito de ofender, ser descortês, ser voluntariamente pesado aos outros, ser hipócrita, etc..
Pensamos que tendo cumprido esses quatro requisitos básicos estamos em condições de aprender a arte de amar.
O amor não exige retorno, não exige afeição do objeto amado, não exige ser correspondido. O amor é incondicional. Quando se faz algo por amor a alguém não se espera nem mesmo o reconhecimento.
Diferentemente do amor, a amizade espera retorno. Ela se desenvolve em um ambiente de afinidades, de proximidades de interesses, de confiança mútua, de diálogo, de uma relação franca, transparente. Um amigo espera ser correspondido pelo outro, ser respeitado pelo outro, cativar e ser cativado pelo outro. Por essa razão a amizade “prende” e o amor liberta. O amigo deseja o outro para si e a pessoa que ama permite que o outro seja o outro.
Quem ama sente-se atraído pelo outro, mas não espera ou exige que o outro seja atraído por ele. Por essa razão um poeta disse que a amizade é “quase amor”.
Chego a pensar que um casamento teria mais chances de ser feliz se os cônjuges primeiro se respeitassem e depois se tornassem amigos. O amor não é necessário para a felicidade no casamento, o respeito sim. A amizade amplia essa possibilidade e o amor seria a culminância, o resultado, a apoteose.
Para transformar o amor-sentimento, contemplativo, despretensioso em amor-em-ação é preciso energia física, determinação e compromisso social.
Tenho ouvido muitos dizerem que Deus é a fonte do amor. Não ouso discordar por entender que Deus é a fonte de tudo. Por outro lado, acho um pouco cômoda essa abordagem. Entendo que se Ele é a fonte, no sentido de que sem Ele não posso amar, isso me desobriga de aprender a arte. Ela me informa que tudo o que tenho de fazer é esperar que a “água” dessa fonte me bafeje ou me inunde.
Prefiro a abordagem de que Deus é o modelo de amor. É aquele que sai da comodidade para a ação. Ele não espera resposta e não exige que correspondamos ao Seu apelo. Ele age e respeita, oferece e não pede em troca para o Seu próprio benefício. Quando exige resposta é para o bem da comunidade de crentes e não Dele próprio.
É difícil amar, é coisa para gente “grande”, isto é, gente que supera, que resiste a indiferença, que não desiste do outro, que aposta no outro, que confia, que venceu a mesquinhez, que soube primeiro ser amigo e respeitar a si mesmo e aos outros.
Sábado 30 de julho de 2011 16:10
Nova Andradina, MS
Antonio Sales
profesales@hotmail.com