Antonio Sales
A divindade não pode ser feitura humana. Isso é: Deus tem que ser Deus. Ser o que Ele é e julgar oportuno ser. Não podemos adequar Deus ao nosso modo de pensar, temos que aceitá-Lo como Ele é.
Em nosso esforço para defender a Deus ou para confortar o ser humano diante de certas frustrações dizemos que Deus sempre está presente, que sempre nos socorre. A nossa ênfase é no Deus que protege em todas as circunstâncias e que atende a todo clamor.
Será verdade? Será que Deus, por vezes, não Se esconde e nos faz esperar mais tempo do que estamos dispostos? Será que Ele está obrigado a nos dizer sim quando queremos que diga? Ele deve fazer, por nós, coisas que não estamos conscientes que precisam ser feitas ou corrigir erros que cometemos? Será que é papel Dele limpar nosso coração sem que especifiquemos o que deve ser limpo ou o que queremos mudar?
Nessa perspectiva de um Deus de plantão quando os problemas surgem basta que oremos, que clamemos a Deus. Se temos alguma tendência à perversidade basta que peçamos a Deus e Ele se encarregará de detectar o problema e curar sem que nós sequer saibamos o que ocorreu. É esse o discurso que emana dos púlpitos: basta abrir o coração.
Por que será que não basta eu abrir a minha casa para que a poeira vá embora? Será que se eu deixar meus arquivos abertos os papéis se organizarão sozinhos, isto é, Deus virá organizá-los? Será que se uma pessoa ficar somente orando conseguirá se formar em Direito ou Matemática, por exemplo?
Ora, se estas coisas mais simples e menos comprometedoras só se resolvem com a minha decisão e respectiva ação, por que nos aspectos mais complexos da minha vida; aqueles que envolvem a minha personalidade, o meu caráter, a constituição da minha identidade, em fim, naqueles aspectos em que me constituo como pessoa Deus iria agir sem minha contribuição, sem minha ação, sem que eu identifique qual o problema que quero superar?
Não consigo entender a vida como algo tão simples. Não entendo a minha relação com o próximo como algo que depende inteiramente de Deus, e a mudança do meu caráter como algo que independa da minha decisão e ação. Não consigo entender Deus como alguém que está inteiramente ao meu serviço e me isentando de responsabilidades. Não consigo pensar em um Deus que se submeta ao meu programa pessoal e que “varra o meu quarto” sem que eu tenha feito a minha parte e lhe diga que deixei uma parte para Ele fazer porque minhas forças se esgotaram. Esse seria o Deus dos acomodados, dos indecisos, dos não comprometidos.
Costumamos espiritualizar todos os aspectos da vida e deixamos o ser humano isento da responsabilidade de agir e buscar compreender as razões do seu fracasso profissional ou relacional. Tudo é atribuído a Deus até as decisões de mudança de comportamento. Esquecemos que mudança de comportamento é resultado de uma decisão pessoal após um processo de esclarecimento e de educação.
Penso que é por isso que Deus às vezes Se esconde. É para que o homem aja, decida, tome as rédeas da sua vida. Deus não quer eternos adolescentes que dependam em tudo Dele. É correto esperar que Deus se responsabilize pela orientação das pessoas até no que diz respeito a decidir se querem ser boas? As pessoas precisam que Deus lhes arrume um emprego ou que venha pessoalmente, ou através de um anjo, lhes ensinar como lidar com o cônjuge ou com os filhos?
Nessa perspectiva de um Deus que está sempre a postos nós esperamos que Ele transforme o nosso cônjuge, adequando-o a nós, ou que eduque os nossos filhos ensinando-os a nos respeitarem. Um Deus assim nos tornaria inúteis e atravancaria o progresso da ciência.
Mas quando eu digo que Deus por vezes se esconde terei alguma base bíblica para isso?
Jó (13: 24) perguntou a Deus: “Por que escondes o teu rosto, e me tens por teu inimigo?” Escrito em 08/2010
profesales@hotmail.com
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