O Terceiro Mundo-I
Antonio Sales
profesales@hotmail.com
Concluímos o texto anterior afirmando que não temos nenhuma razão para continuar repetindo que o mundo vai de mal a pior e nos propondo responder às perguntas: o que fazer se já estamos acostumados a pensar em termos de um mundo que está piorando? Quais as conseqüências desse modo de pensar?
Recorro a uma ilustração. Vamos supor que tenhamos combinado de almoçar junto num certo dia. Enquanto me preparo par almoçar você me telefona dizendo que, por uma razão alheia à sua vontade, vai atrasar um pouco. O atraso não será menor do que uma hora e não há um tempo máximo previsto. Portanto, estou liberado para almoçar sem a sua presença. Começo pensar na sua situação e me proponho reservar almoço para você, pois, suponho que deverá chegar com muita fome.
Nesse momento ouço uma voz me informando que o almoço está pronto e que não devo me deter pois ele foi preparado com alguns ingredientes altamente perecíveis e que dentro de meia hora, o mais tardar, ele poderá não estar mais em condições de ser consumido.
Se eu acreditar nessa informação só me restará a opção de almoçar até me fartar e distribuir a sobra entre os animais ou encaminhá-la ao lixo. Afinal, para que guardar? Não servirá mesmo para mais nada quando você chegar.
Voltemos ao assunto. Se creio que o mundo está piorando, que vai se estragar mesmo, então não resta fazer nada mais do que explorar o pouco que existe. Se ele está piorando, e dentro em breve estará imprestável, vou sugá-lo enquanto resta alguma coisa. Por que vou me preocupar em deixar algo para quem vem depois, se vai estar tudo estragado quando esse alguém chegar? Por que me preocupar em escolher um bom candidato a algum cargo público se, de qualquer jeito, vai dar mesmo tudo errado? Por que defender a ética e a moral se o fim é desastroso e está próximo?
Não importa a “fome” com a qual esse alguém vai chegar, se pressuponho que a “comida” vai estar estragada não há razão para eu me preocupar com isso e me solidarizar. Não há razão para investir no futuro de quem ou o que quer que seja.
Esse discurso de que o mundo está irremediavelmente piorando é anti-solidário e fere os princípios basilares do cristianismo.
Por que vou me preocupar com algo que, de qualquer jeito, está danificado? Por que lutar em favor de algo, ou de alguém, que está, irremediavelmente condenado?
Penso que é essa razão de sermos um pouco descorteses. Temos medo do outro porque ele é corrupto e pode me corromper. Se cremos ele está contaminados com o germe da morte temos uma forte razão para fugir dele.
Veja só a incoerência! Esse equívoco, de dizer que o mundo está piorando, provoca preconceito. Como preconceito é maléfico essa concepção que temos a respeito do mundo deve ser abandonada.
Mas há uma segunda razão para abandonarmos essa idéia.Este modo de pensar amesquinha Deus porque nos leva a considerá-Lo como aquele político que, sendo eleito por um partido, passa a administrar somente para os que o elegeram.
Pensar num político assim nos causa repugnância, não é verdade?. Nós, cidadão éticos, jamais votaríamos nele. No entanto, esse é o Deus que nós concebemos. Um Deus que cuida dos interesses somente da sua igreja. Um Deus para o qual o mundo e o universo estão colocados em último plano.
Mas esse pensar sobre o mundo também nos amesquinha, nos torna ingênuos. Ingênuos ao ponto de fazer afirmações que não são verdadeiras somente porque ouvimos alguém falar.
Não podemos provar que o mundo está pior e, se não podemos provar, não devemos dizer.
Mas podemos ir mais longe em nossas reflexões sobre o assunto. Essa concepção de que as pessoas “do mundo” não prestam, são suspeitas a priori, nos torna HIPÓCRITAS.
Hipócritas ao ponto de nos beneficiar da ciência, usufruir dos benefícios que o seu progresso nos trouxe e, ao mesmo tempo, desdenhar dela dizendo que é contra Deus, contra a religião, porque é produto do homens sem Deus.
Essa visão de mundo nos torna hipócritas porque ao mesmo tempo em que nos beneficiamos do relacionamento com os outros dizemos que eles são indignos de confiança.
O espaço acabou, mas o assunto continua.
Outubro de 2008
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